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Ex- bolsonarista: mulheres relatam rompimento de relacionamentos

Durante período eleitoral, mulheres terminam relacionamentos após descobrirem que seu par votou em Bolsonaro. Confira relatos!

Por Mariana Oliveira

08|11|2022

Alterado em 22|11|2022

O que te leva a admirar e se relacionar com alguém? Basta apenas o match e a atração físico-emocional, ou há outras características que determinam se a pessoa é digna do seu amor?

Sabemos que a adoção do homeoffice na pandemia estreitou o convívio entre casais que tiveram de compartilhar mais tempo juntos. Só em  2021, foram registrados 80.573 divórcios no Brasil, aumento de 4% em comparação com o ano anterior. O fato é que, obrigados a conviverem mais tempo juntos, a divergência de opiniões ficaram mais evidentes.

Mesmo antes das eleições presidenciais em 2018 existiam desavenças políticas, a utilização de termos como “mortadela” para identificar pessoas ligadas a pautas da esquerda, e “coxinha” se referindo à direita eram comuns de ouvir. Porém, durante a primeira candidatura de Jair Bolsonaro (PL) à presidência, os relatos de desentendimentos tornaram-se intensos. À época, o portal G1 realizou um levantamento mostrando o aumento de brigas relacionadas a política.

A psicóloga Angelita Scardua, doutora em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP), estudiosa em assuntos sobre a felicidade, explica que o posicionamento político de alguém expressa diretamente os valores dessa pessoa. Em um primeiro momento, as ações tomadas por um casal estão atreladas à paixão. “Pessoas apaixonadas tendem a não prestar atenção em coisas essenciais para a vida cotidiana”’,esclarece.

“Estudos sobre felicidade em relações mostram que casais com valores parecidos têm mais chances de conviverem por mais tempo com uma convivência mais satisfatória”. Para Angelita, durante um conflito, se o casal não tiver maturidade psicológica para tentar compreender as motivações do outro a relação não irá suportar.

Pela insustentabilidade de manterem um relacionamento com tantos conflitos de interesse, mulheres vêm ponderando atitudes de seu parceiro ou parceira, que não condizem com suas ideias. Nesse ritmo, algumas decidiram encerrar relacionamentos ao descobrirem que seu companheiro apoiava pautas e atitudes defendidas por Bolsonaro.

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Ex namorada de Renata era eleitora de Bolsonaro. Elas romperam por isso

©Arquivo Pessoal

Como é o caso de Renata Alves, mulher lésbica e moradora de Embu das Artes, região Metropolitana de São Paulo. Ela conta que manteve um relacionamento durante três anos, até que em 2018, a então companheira confessou ter votado em Bolsonaro. O atual presidente que é abertamente contra os direitos LGBTQIA+, pauta que afirma ser responsável por “destruir a família”. Ele também é autor de falas preconceituosas já conhecidas, como a dita em 2011, ainda ocupando o cargo de deputado federal: “seria incapaz de amar um filho homossexual. Não vou dar uma de hipócrita aqui. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí”.

Renata conta que elas discutiram e logo terminaram o relacionamento. “Sendo uma mulher lésbica, não entendia como poderia voltar em um homem que não compartilhava das mesmas ideologias e faz questão de falar abertamente o quanto mulheres eram inferiores aos homens”.

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Atualmente, Isabela questiona o posicionamento político antes de firmar relacionamento.

©Arquivo Pessoal

Como vemos, compactuar com a mesma visão de mundo pode pesar na hora de manter um relacionamento. A exemplo, o vivido por Isabela Carneiro, moradora de São José dos Campos, interior de São Paulo. Discutir política não era algo comum em sua vida e mantinha seus ideais para si. “Eu tinha minha visão e aqui [região onde vive] é minoria, então evitava falar porque as pessoas só queriam atacar”.

Isabela rompeu um relacionamento de quatro anos, pois a pessoa não compartilhava as mesmas convicções: “não foi o principal fator, mas somou bastante”. Durante a pandemia, as dificuldades aumentaram. “Ele era contra o isolamento social e acreditava em ‘imunidade de manada’. Dizia que a economia deveria importar mais, pois as pessoas morreriam de qualquer forma”. O casal rompeu após tais alegações.

Considera-se imunidade de rebanho ou manada, uma imunização coletiva de forma indireta à doenças infecciosas. No caso da Covid-19, especialistas estimavam que era necessário cerca de 70% a 90% da população brasileira vacinada para efetiva proteção.

Jair Bolsonaro foi amplamente criticado por sua gestão durante a pandemia, principalmente no tocante à vacinação. Durante lives em redes sociais e declarações em rede nacional, disse que não se vacinaria. Em 2020, após o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizar a aplicação de medidas restritivas para quem se recusasse a tomar vacina, o presidente se manifestou: “Alguns falam que eu estou dando um péssimo exemplo. Eu já tive o vírus, já tenho anticorpos, para que tomar vacina de novo? Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina”.

Durante live transmitida em 2021, o presidente defendeu a imunidade de rebanho, afirmando ter “sido vacinado” por ter contraído o vírus anteriormente, assim como todas as pessoas que haviam sido contaminadas.

Antes das eleições presidenciais de 2018, Isabela nunca havia sentido de forma tão abrupta uma dificuldade de convívio com diferentes opiniões. “Depois do Bolsonaro, os diálogos ficaram muito extremos e fanáticos”, explica. Hoje, em um novo relacionamento, conta ter tido essa preocupação antes de firmar compromisso. “Eu tinha isso na cabeça, se ele falasse que era bolsonarista, descartaria de cara. Foi uma das minhas primeiras perguntas”.

A psicóloga Angelita explica que “escolhas políticas falam de valores”, prioridades atreladas ao que consideramos fundamental para “construir a vida em uma sociedade adequada”. Ela também acredita que sustentar diferenças em um relacionamento é um processo complexo. Ao traçar um futuro, as convicções opostas do casal se tornam insustentáveis a longo prazo. “No fim das contas, a polarização política nos convoca a reconhecer e assumir aquilo que consideramos essencial para a condução da própria vida. Se as percepções são muito diferentes, levam a uma ruptura”, conclui.