Na foto, mulher negra fala ao microfone, ao lado de outras quatro pessoas, na parede ao fundo há uma exposição de fotos

Vilma Reis: ‘a política precisa se aproximar da vida real’

Durante evento, Vilma Reis, Guilherme Boulos e Kelli Mafort comentam percepções sobre as eleições de 2022 e fragilidade da democracia.

Por Beatriz de Oliveira

25|08|2022

Alterado em 25|08|2022

A fotografia do Congresso Nacional envergonha o Brasil. É o que apontou Vilma Reis, socióloga e ativista do movimento de mulheres negras, durante evento em São Paulo na Fundação Rosa Luxemburgo, organização alemã de formação política pautada na tradição dos movimentos trabalhistas, feministas e antirracistas. Para a também candidata a deputada federal na Bahia, o voto antirracista não passa apenas por apoiar candidatos que se dizem favoráveis ao direitos dos negros, mas sim em votar em mulheres negras e indígenas.,

Somente 125 deputados federais que compõem a Câmara atualmente se autodeclaram negros, isso representa 24,3%. Do total de 513 deputados, há apenas uma mulher indígena: Joênia Wapichana. Já no Senado Federal, 13 senadores se autodeclaram negros em um total de 81.

O apontamento de Vilma Reis ocorreu em meio ao debate “Resistir e construir: os desafios da democracia socialista”. A discussão marcou a troca de diretor do escritório da Fundação Rosa Luxemburgo – Brasil e Paraguai: Torge Loeding deu lugar a Andreas Behn.

O líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) Guilherme Boulos também compôs o debate. Para ele, as eleições de 2022 marcam a disputa entre “democracia e barbárie”. Admite que nunca tivemos uma democracia plena, com a existência do racismo e das várias formas de violência. Além disso, alerta que não é exagero dizer que as liberdades democráticas básicas estão em jogo hoje.

O também candidato a deputado federal por São Paulo aposta na vitória de Lula no primeiro turno das eleições presidenciais como o melhor caminho para preservar a democracia. No entanto, salienta que mesmo que isso aconteça a população deve tomar às ruas, pois acredita que Jair Bolsonaro não aceitará uma eventual derrota.

Sobre o pós-eleições, Vilma Reis destaca outro ponto: em caso de vitória de Lula, os articuladores negros não podem ficar de fora de seu governo, ou ter que “pedir licença para entrar”.

O receio da socióloga tem justificativa. Em abril, uma foto tirada durante evento de indicação de Geraldo Alckmin como vice de Lula repercutiu negativamente. Não havia nenhum negro: eram duas mulheres e 17 homens brancos.

Heinz Bierbaum, presidente do Partido da Esquerda Europeia, defende que a reconstrução da democracia brasileira passa por uma transformação social e ecológica, num contexto em que os trabalhadores sejam incorporados nessa luta. A fala vai ao encontro da definição da ideologia do socialismo democrático, tema tratado na discussão, que propõe uma economia democrática. O alemão destaca ainda a necessidade de combater tendências fascistas e racistas.

Vilma Reis concorda. Diz que o povo deve “estar no orçamento [público]”, mas não apenas na condição de beneficiários de programas sociais.

“Nós queremos que quem anda de ônibus possa planejar o ônibus”, exemplifica.

Nessa mesma linha, a candidata salienta: “a política precisa se aproximar da vida real”. Ela se refere aos problemas enfrentados no cotidiano de quem vive nas periferias brasileiras, como a falta de segurança e o preço dos alimentos.

Na extensa lista de dificuldades vivenciadas pela população brasileira, a fome tem lugar garantido. Em julho de 2022, o Brasil voltou a ser mencionado no Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) após oito anos fora da lista. Segundo pesquisa “Olhe para fome”, de 2022, há 33,1 milhões de pessoas passando fome no país, enquanto mais da metade da população brasileira vive com algum grau de insegurança alimentar.

Diante disso, Kelli Mafort, diretora do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), elucida que para além da luta por direitos, a população tem lutado para se manter viva.

“Democracia é um vazio enorme se o povo não tiver barriga cheia”, diz.