O amor encontrará o amoroso

Podemos partir da sugestão de Bell Hooks no livro Tudo sobre o amor: "o amor é o que o amor faz". Aprenderemos sobre como amar praticando

27|07|2023

- Alterado em 27|07|2023

Por Aline Bispo

O amor encontrará o amoroso foi uma frase dita por uma amiga recentemente, em um almoço, enquanto falávamos sobre nossas práticas diárias de afeto. Este ano tenho praticado o exercício de presentear pessoas com flores ou outras coisas que possam transmitir carinho. Não é um exercício obrigatório, mas que tem me colocado em uma condição de protagonismo, onde ajo a partir do pensar sobre o amor.

Ao final da abertura da exposição Quando eles chegam em casa eu fico feliz da Fraternidade Vilanismo, sobre o qual já falei aqui nesta coluna [inaugurada na Galeria Luis Maluf no último dia 08 de julho, sob minha curadoria e de Rodrigo Carinhoso], levei flores aos onze artistas.

Parti da ideia de que a ação de levar flores a homens negros também está aliada à prática de acreditar que os dados estatísticos de morte entre estes homens, especialmente por violência, precisam cair. Enquanto os dados de amorosidade para com eles precisam crescer.

Benjamin Clementine é um cantor, poeta e músico autodidata, extremamente sensível, e dos quais mais gosto e muito ouvi no início do primeiro semestre de 2023.

Em I have been, seu último disco, lançado em outubro de 2022, uma das músicas que mais gosto se chama Difference. Em um dos trechos traduzidos podemos ler:

“Ouvi dizer que você quer fazer a diferença, só o amor pode encontrar uma diferença”.

Música “Difference”, Benjamin Clementine

Recentemente, li uma crítica sobre seu trabalho e sobre como sua negação em falar de amor e o desejo de ir além dessa temática estiveram presentes durante um período de sua carreira. Essa barreira parece ter se rompido após seu casamento, em 2018, e sua relação de vida com o filho e a esposa.

Mas, além de Benjamin, temos a banda indie-rock TV on the Radio, formada por uma maioria de homens negros, que também fala sobre o amor. Uma de suas músicas mais conhecidas e um dos meus videoclipes preferidos, lançada em 2011, é Will do, que podemos traduzir como “Vá e faça”.

Ao longo dos anos, gostei e desgostei algumas vezes da letra desta música e pensei sobre a ideia de que alguém estivesse tentando ultrapassar o tempo do outro no amor, especialmente na tradução do trecho abaixo:

“Acho que somos compatíveis; Eu vejo que você acha que estou errado, mas qualquer hora serve, meu amor”

Música “Will do”, TV on the Radio

Me incomoda a ideia de perder o rumo e a autoestima pela busca de um afeto a partir do tempo do outro. Entretanto, hoje gosto de pensar que essa música não precisa se direcionar a uma pessoa, mas que pode ser a voz do amor nos dizendo que, às vezes, podemos pensar que somos incompatíveis a ele, mas que ele nos encontrará na hora certa, na hora em que estivermos prontos para recebê-lo.

E qual é a hora certa para estarmos prontos para receber esse afeto em totalidade? Não há como saber, pelo menos eu não tenho essa resposta. Mas há como praticar.

Podemos partir da sugestão de Bell Hooks no livro Tudo sobre o amor: “o amor é o que o amor faz”. Colocar o afeto como prática diária é se ver como protagonista e sair de um lugar passivo e permissivo, onde receberemos o amor. Aprenderemos sobre como amar praticando. Assim, como disse essa amiga, o amor encontrará (a partir da prática) o amoroso.

Aline Bispo é artista visual, ilustradora, curadora e colecionadora de arte. Em suas produções investiga temáticas que cruzam a miscigenação brasileira, gênero, sincretismos religiosos e étnicos, partindo do seu lugar no mundo.

Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

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