Vozes Negras Pelo Clima em Brasília: tudo sobre o evento no DF

Confira as agendas de advocacy climático da rede

10|05|2024

- Alterado em 10|05|2024

Por Amanda Costa

Olá minha lindeza climática <3

No começo de Abril encontrei as minhas gatas garotas do Vozes Negras Pelo Clima numa ecovila em Brazlândia, uma cidade próxima a Brasília. Matamos a saudades, definimos os próximos passos da rede e desenhamos nosso planejamento estratégico para 2024.

Somos uma rede composta por 11 mulheres negras oriundas da periferia, quilombos, comunidades ribeirinhas e catadoras de coco babaçu, que atuam na defesa dos direitos socioambientais de territórios historicamente marginalizados, que têm sofrido os principais impactos das mudanças climáticas.

Foi mágico!

Mulheres negras reunidas enquanto seguram uma bandeira amarela com os dizeres ˜Vozes negras pelo clima

Mulheres negras se reúnem em Brazlândia para debater o clima

©Amanda Costa

Sempre que estou com minhas companheiras de luta saio energizada, inspirada e com a certeza de que todo o meu ativismo climático tem o potencial de transformar os rumos da minha cidade, do meu país e até mesmo do mundo rs.

Reencontrar as gatas climáticas da rede depois de quatro meses da COP 28 e ficar três dias planejando nossos próximos passos foi potente! Um dos pontos altos da imersão foi a visita da Ieda Leal, Secretária de Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Como mulher negra, Ieda contou que tem um carinho muito grande pela rede, pois enxerga em nós a continuação de um trabalho histórico do movimento negro. Agora no governo, ela revelou que possui uma equipe pequena, poucos recursos e dificuldade de introduzir a pauta antirracista em estados menores, mas que essa é uma missão de vida e vai seguir firme até o final.

Foi uma tarde bem inspiradora e nos próximos dois dias nosso foco foi em definir o rumo da rede e os nossos principais objetivos, tanto para fomentar a mobilização em nossos territórios em torno da pauta tanto quanto para potencializar a nossa estratégia de advocacy climático.

Tudo isso rolou no final de semana e na segunda-feira, Lídia Lins, Camila Aragão, Tâmara Terso e eu, Amanda Costa fomos para a capital com o intuito de realizar conversas com políticos, coordenadores ministeriais, tomadores de decisão para alavancar a clima de justiça climática e combate ao racismo ambiental.

Nossa primeira agenda foi com o deputado federal eleito por São Paulo Nilto Tatto, que também é o atual coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista Mista. Trouxemos a importância da ratificação do Acordo de Escazú no congresso e a possibilidade de criar um canal de diálogo da rede com a frente. O deputado disse que o parlamento tem sido dominado por uma ala conservadora que abre pouco espaço de diálogo para pautas progressistas. No entanto, ele nos disse que há uma “janela de oportunidade política” em junho, mês do meio ambiente, e se comprometeu a aumentar seus esforços para movimentar essa agenda.

Enquanto ativista, nosso trabalho é pressionar o poder público, criando estratégias para alavancar as agendas que mais cedo ou mais tarde, vão influenciar na vida ou na morte do nosso território.

[Saiba mais sobre o Acordo de Escazú aqui]

Logo em seguida, fomos para o Itamaraty, também conhecido como Palácio dos Arcos, a sede do Ministério de Relações Exteriores do Brasil. Quem nos recebeu foi a equipe de negociações climáticas, representada pela diplomata Bruna Veríssimo e sua equipe Leonardo Souza (transição justa, povos indígenas e direitos humanos) e Adriana (gênero e G20).

Querida leitora, deixa eu abrir um pequeno parênteses. Eu sou formada em Relações Internacionais e acho chiquérrimo estar nesses espaços. Lembro das aulas, debates e vejo que parte dos sonhos da jovem Amanda estão finalmente se tornando realidade 🥹  

Por conta dessa reunião, entendemos melhor de vários babados climáticos:

– TROIKA das Presidências das COPs: é um esquema novo, no qual une 3 países responsáveis por presidir a COP para cooperarem e adotarem uma maior ambição climática na agenda das negociações.

– A ABU (grupo formado por Argentina, Brasil e Uruguai nas negociações climáticas) se transformou no Bloco Sul, pois houve a entrada do Paraguai;

– A única forma de inserir as questões raciais nas negociações é trabalhar com o conceito de interseccionalidade. Essa metodologia será testada na revisão do Plano de Trabalho de Lima;

– O Brasil está em conversa estreita com a AILAC – Aliança Independente da América Latina e Caribe”). Bloco político de negociação na UNFCCC formado por Perú, Costa Rica, Colômbia, Chile, Guatemala, Honduras, Panamá e Paraguai;

– A UNFCCC na COP 28 institucionalizou o “Youth Climate Champion”, uma representação de juventude com diálogo direto com os tomadores de decisões.

– Esse ano, a UNFCCC reduzirá o número de credenciais para os países e organizações da sociedade civil (acredita que eles até bloquearam os hóteis? Ninguém consegue fazer reservas D: )

Babados fortíssimos, né gata?

Quatro mulheres pretas e uma mulher branca lado a lado com dois homens brancos de terno e gravata, todos vestidos socialmente. Ao fundo, persianas brancas e na frente, três cadeiras de escritório pretas

Uma das muitas reuniões em Brasília!

©Amanda Costa

Por fim, a minha última reunião neste dia com a rede foi com a Joana Nunes, Coordenadora-Geral de Bioeconomia e Ciências Exatas, Humanas e Sociais do Ministério de Ciências, Tecnologia e Inovação (MCTI), mas antes teve muita bateção de cabeça.

Acredita que o ministério tem duas funcionárias com o mesmo nome??? A única diferença é que uma se chama Joana e a outra se chama Juana. E como a Lei de Murphy não falha, é óbvio que a recepção nos encaminhou para o lugar errado. Primeiro fomos recebidos por Carlos Wagner e pela Cláudia Maya, da Secretaria de

diretoria de popularização da Ciência, Tecnologia e educação científica.

Essa reunião não estava na agenda, foi um encontro não programado porque a recepção confundiu a coordenação que iria nos atender… Apesar do estranhamento inicial, foi um pouco proveitoso, pois soubemos a primeiríssima mão que o MCTI está trabalhando para desburocratizar seus editais e criar uma relação com produtores de ciência fora das universidades. Esses editais seguirão com a orientação de serem desenvolvidos com o CNPq, mas com uma flexibilidade maior de participação e o objetivo principal será a popularização da ciência entre meninas e mulheres.

Muito massa, né? Agora deixa eu te contar o desenrolar da agenda oficial heheh

Com a Joana certa, conversamos sobre a necessidade de inclusão das comunidades atingidas e das integrantes da nossa rede na pesquisa da 5a Comunicação que informa a atualização das NDCs brasileiras. Também trouxemos a importância da racialização e inclusão dos dados desagregados nas plataformas de dados que estão informando a construção do Plano Clima e outras políticas climáticas.

Ela nos ouviu atentamente, mas relatou dificuldade de integração com a parte de Clima do MCTI. Foi uma tristeza imensa saber que os diálogos intersetoriais e interministeriais tão mais no discurso do Presidente do que no dia a dia dos ministérios e da secretária…

Depois desse batidão de agenda, eu fui para o aeroporto, pois meu voo sairia às 18h, mas as minhas companheiras de luta ainda tiveram duas reuniões bem especiais, com a 

– Secretária Nacional de Mudanças do Clima Ana Toni, Chefe de Gabinete Monique Ferreira, Diretora de Combate ao Racismo do MIR Marcia Lima e Coordenadora geral de adaptação na Secretaria Nacional de Mudança do Clima Inamara Melo e

– Joci Aguiar, Assessora de Justiça Climática do Gabinete da Ministra das Mulheres e Malu Aquino, assessora LBT do Gabinete da Ministra.

Foi um intensivão de planejamento, advocacy e esforços para puxar a agenda de clima em Brasília. Eu saí MOÍDA desse encontro, mas foi mega importante estarmos na cidade e fazer todas essas reuniões. Enquanto ativista climática, gostaria de ver as mudanças acontecendo mais rápido, tratando com urgência essas demandas que para nós, mulheres negras, são tão prioritárias.

Confesso que às vezes sinto que a agenda socioambiental foi cooptada pelas grandes empresas, principalmente nos debates de mercado de carbono, ESG, empreendedorismo verde e até mesmo com a hipervalorização das soluções individualizadas (reciclagem, compostagem, dietas vegs).

Eu quero discutir reforma agrária, distribuição de riquezas, taxação dos milionários! Na minha concepção, se queremos ter efetividade na luta contra a crise climática precisamos investir em reformas estruturais na nossa nação.

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.