Empreendedorismo na periferia exige trabalho coletivo

Quais são as práticas possíveis, viáveis, dignas para o empreender feminino (e feminista) nas periferias.

Por Redação

26|05|2019

Alterado em 26|05|2019

Texto originalmente publicado em nossa coluna mensal no portal Aupa: Jornalismo de Impacto

Diferentes trajetórias, mas reunidas por sermos “periféricas”. Éramos jovens jornalistas, cada uma moradora de um bairro diferente das regiões mais afastadas da cidade de São Paulo, quando criamos o coletivo “Nós, mulheres da periferia”.

Hoje, somos um projeto jornalístico independente, atuante em diferentes plataformas de comunicação. Nossa principal diretriz é disseminar conteúdos produzidos por mulheres e a partir da perspectiva delas, tendo como linha editorial a intersecção de gênero, raça, classe e território.

Juntas fazíamos parte do Blog Mural do jornal Folha de S. Paulo. O projeto cresceu e se tornou a Agência Mural de Jornalismo das Periferias, que mantém o blog e também produz conteúdo próprio e para outros canais de comunicação, mobilizando mais de 60 pessoas.

Em 2012, surgiu a oportunidade de preparar um conteúdo especial para a versão impressa do jornal sobre o Dia Internacional da Mulher. Em 7 de março, integrantes fundadoras do coletivo publicaram um artigo atentando para a invisibilidade e direitos não atendidos de uma parte das mulheres – as que moram em bairros periféricos de grandes metrópoles. O título escolhido foi: “Nós, mulheres da periferia”.

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Feira de Economia Solidária realizada pelo Nós, mulheres da Periferia em Itaquera, em 2016.

O texto teve grande repercussão e foi replicado em outros veículos de mídia, além de ter encontrado eco entre nossas iguais: mulheres moradoras da periferia que se sentiram representadas. O artigo foi amplamente compartilhado nas redes sociais e, além disso, leitoras do jornal se manifestaram por cartas e mensagens. Percebemos, naquele momento, a existência de um vazio de representatividade. A partir de então, iniciou-se o processo de pesquisa e consolidação do coletivo.

O website nasceu em 2014 com o intuito de contribuir para a construção de narrativas jornalísticas mais humanas e contextualizadas. Além do site, que mantemos permanentemente, realizamos em 2015 o projeto “Desconstruindo Estereótipos”, promovendo oficinas sobre mídia em diferentes bairros e organizações sociais, impactando cerca de 100 mulheres. Em consequência, nasceram a mostra artística “Quem somos [POR NÓS]” (2015) e o curta-metragem “Nós, Carolinas” (2017).

Construímos o coletivo de forma muito orgânica e espontânea. Primeiramente, ao nos assumirmos feministas. Antes, esta nunca tinha sido uma questão e, com a repercussão, tivemos que, nós mesmas, entendermos que fazíamos parte de uma causa, ainda que a partir de uma diversidade de ideias, crenças e opiniões.

Também refletimos sobre como gostaríamos de construir nosso trabalho, se dentro de uma perspectiva voluntária e militante ou se estávamos defendendo uma causa profissionalmente. Diante disso, em 2018 resolvemos conciliar as duas possibilidades e nos formalizamos com um CNPJ.

Nossas experiências a partir das nossas periferias sempre nos colocaram em ações coletivas, seja por necessidade ou por culturalmente vivermos em comunidades. Entendemos que empreendedorismo exige trabalho coletivo e que, ao que hoje se atribui à criatividade e inovação nos projetos e negócios, venha de nossas origens que, claro, conseguimos aperfeiçoar com acesso à educação.

Queremos compartilhar, então, nossas experiências, refletindo sobre quais são as práticas possíveis, viáveis, dignas para o empreender feminino (e feminista) nas periferias. Para isso, também pretendemos ouvir mulheres e apresentar outras histórias, pois, afinal, “Nós, mulheres da periferia” somos diversas e nos opomos aos perigos da história única.