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SP: 87% das prisões por lei de drogas não têm testemunha além do próprio policial

Pesquisa da Iniciativa Negra expõe relações entre raça e execuções penais pela lei de drogas no estado de São Paulo

Por Beatriz de Oliveira

23|11|2023

Alterado em 23|11|2023

Ter ‘atitude suspeita’ está entre os principais motivos que levam  policiais a abordarem e prenderem jovens no estado de São Paulo, com base na lei de drogas. A conclusão é do estudo Liberdade Negra Sob Suspeita, publicado nesta quinta-feira (23) pela Iniciativa Negra, organização que atua por justiça racial e por uma nova política de drogas. 

O relatório analisou 114 processos penais datados até fevereiro de 2020. Na maioria deles, os policiais não descrevem qual “atitude suspeita” levou à abordagem. “Em patrulhamento, avistaram uma pessoa em atitude suspeita num motociclo, vindo a ser abordado e revistado”, diz um dos depoimentos policiais destacados.

A pesquisa traz dados que permitem analisar relações entre raça e tratamento penal. Sem surpresas, se verifica que a maioria das prisões pela lei de drogas são de jovens negros com baixa escolaridade. Além disso, metade dos presos não tinha antecedentes criminais e estavam desempregados.

Outro ponto abordado no estudo é a violência policial. Entre os processos que relatam agressões policiais, 66% dos casos são contra pessoas negras e 33% contra brancos.

Confira alguns dados: 

54% das pessoas presas por crimes relacionados à lei de drogas se autodeclaram negras;

58% dos presos tem entre 18 e 21 anos;

71% não havia concluído o ensino fundamental;

40% dos jovens tinham ocupação profissional no momento da prisão, normalmente relacionada a serviços gerais;

66% das pessoas tinham renda mensal menor que R$1.500;

Em 87% dos casos, a única testemunha do processo criminal é o policial.

Segundo os pesquisadores, há um padrão de severidade adotado pelo judiciário ao definir as penas relacionadas à lei de drogas. A maioria das condenações é por tráfico privilegiado (quando o réu é primário e não integra organização criminosa), que apesar de não ser considerado crime hediondo, aparece equiparado à crimes de maior gravidade em 33% dos processos. Essas decisões servem como justificativa para aplicar penas em regime fechado e multa. 

Para Nathalia Oliveira, socióloga e cofunfadora da Iniciativa Negra, a produção de materiais que escancaram o racismo nas prisões por drogas e no cenário de encarceramento em massa contribuem para combater essas violações.

“Todos os dias temos contato com relatos de mães que perdem seus filhos em confrontos com as forças de segurança ou que são privados de liberdade sob o argumento do combate às drogas. Precisamos produzir conhecimento material e simbólico a respeito desse mecanismo tão eficaz de prisão de jovens negros, para então incidir sobre violações de direitos e violências a fim de minimizar injustiças”, disse em declaração para a imprensa.

A pesquisa Liberdade Negra Sob Suspeita foi produzida em parceria com a Rede Reforma, Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas, e com apoio do Núcleo Especializado de Situação Carcerária (Nesc) da Defensoria Pública de São Paulo.