Pobreza menstrual: é muito difícil ser mulher neste país

Tenho dinheiro para comprar absorventes e condições para fazer meus cuidados pessoais, mas e quem não tem?

Por Redação

13|10|2021

Alterado em 23|11|2021

“Bolsonaro veta Projeto de Lei que previa doação de absorventes para pessoas de baixa renda e em situação de vulnerabilidade”. Eu li esta notícia na semana passada e surgiu em mim um ódio tão grande deste país. A raiva domina o meu ser e, antes que alguém aponte, sim, estou de TPM (tensão pré-menstrual) e vou compartilhar meus desalinhamentos hormonais por aqui (desculpe por isso).

Vou sangrar nos próximos dias. Tenho dinheiro para comprar absorventes e condições para fazer meus cuidados pessoais, mas e quem não tem? Chamamos isso de pobreza menstrual, que significa o não acesso a itens básicos de higiene, água, entre outros, por pessoas de baixa renda e em situação de vulnerabilidade.

Pelo mesmo 713 mil de meninas não acessam a banheiro ou chuveiro em suas casas de acordo com o estudo Pobreza Menstrual no Brasil: Desigualdade e Violações de Direitos; outras 4 milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas (Unicef, 2021).

É para essa população que foi negado um direito que para mim parece básico, mas que não é considerado assim. O podcast Conversa de Portão desta semana abordou esse tema e os tabus no entorno da menstruação.

Eu menstruo, sou mulher e o simples fato de ser um corpo feminino em um país machista também me coloca em lugares de medo quando falo em mobilidade e direito de ir e vir.

Eu menstruo, sou mulher e estou cansada de listar notícias confirmando que circular e movimentar meu corpo nesse país machista é provocar uma estrutura que não quer que eu saia de casa, acesse espaços públicos e de poder.

Antes do veto de Bolsonaro vir à tona, iria escrever sobre o receio que ainda tenho de pegar minha bike e andar por aí, não apenas esse medo comum de ser atropelada, porque muitas pessoas que andam de veículos automotivos por aí não respeitam ciclistas, mas o medo do assédio.

Um vídeo circulou na internet há duas semanas, em que uma ciclista foi atacada por dois homens, que aproximaram o carro em sua direção e apalparam seu corpo. Ela caiu da bike e os caras foram embora. Os dois foram identificados e presos em flagrante. Ainda assim, ela foi tocada porque andava de bike na rua. Quantas de nós vive esse medo e é privada de acessar o espaço público porque tem medo de passar por situações similares?

Fiz uma busca para saber se de fato era coisa da minha cabeça, ou se as mulheres estão em menor número em grupos de ciclistas. A pesquisa mais recente que encontrei é de 2016 e foi realizada pelo GT de Gênero do CicloCidade (Associação de Ciclistas Urbanos da Cidade de São Paulo). De acordo com o estudo, feito em seis capitais brasileiras, incluindo São Paulo, o número de mulheres pedalando é de apenas 7%, sendo que aqui na cidade, a média cai para 6%.

Eu menstruo, sou mulher e por isso a cidade não é segura para mim. Porque eu posso ser abusada, violada, e não tem justiça para me proteger. É como eu sinto depois de ver a notícia do caso da produtora de eventos Mariana Ferrer que denunciou caso de estupro de vulnerável (ela alegou ter sido dopada e estuprada) pelo empresário Camargo Aranha, mas que a justiça considerou inocente. Estudo do Instituto Datafolha de 2017 apontou que em 99% dos casos, os estupradores não são condenados.

Eu menstruo, sou mulher e estou cansada de listar notícias confirmando que circular e movimentar meu corpo nesse país machista é provocar uma estrutura que não quer que eu saia de casa, acesse espaços públicos e de poder.

Coluna originalmente publicada no Expresso Na Perifa

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