O atentado em Sapopemba e o conflito Israel-Hamas

É preciso que, mais uma vez, assumamos a responsabilidade por combater essa cultura de violência que nos cerca, levando o amor como resposta transformadora

06|11|2023

- Alterado em 07|11|2023

Por Victória Dandara

Na manhã de 23 de outubro, um jovem entrou armado em uma escola estadual na zona leste de São Paulo (SP), deixando três feridos e uma vítima fatal. O atentado não é um incidente isolado. Apenas nos últimos quatro anos, tivemos mais da metade de todas as invasões armadas em instituições de ensino registradas no país, de acordo com dados do Instituto Sou da Paz. Ainda em 2023, uma professora foi assassinada a facadas na capital paulista.

Essas situações me fizeram pensar também na guerra que se instala entre Israel e Hamas, em que presenciamos atrocidades de ambos os lados, já totalizando um número de 6,4 mil mortos, na data em que este texto foi escrito. De onde vem tanto ódio? Um ódio que assassina mais de 2 mil crianças sem sequer vê-las como humanas.

Em um primeiro momento, ao analisar os dois cenários de violência acima, surge a pergunta: o que essas pessoas que puxam o gatilho passaram para sentir um desejo tão intenso de destruição? Não posso acreditar que tenhamos um número tão grande de psicopatas em nossa sociedade. Portanto, se não se trata de uma questão de saúde mental ou de uma predisposição inata à violência, podemos pensar que esse sentimento de destruição surge de algum outro lugar.

São necessários anos, às vezes décadas, de humilhações, violações e opressões para que as pessoas simplesmente reproduzam o que aprenderam ao longo da vida, canalizando seu ódio para algum lugar.

De forma alguma estou tentando justificar qualquer um dos lados da guerra, e muito menos defender um adolescente que entra na escola disparando tiros contra colegas e professores. No segundo caso, nem tenho muitas informações sobre o autor do atentado em Sapopemba. No entanto, realmente acredito que vivemos em nossos tempos uma cultura de ódio e violência generalizada.

Essa cultura se manifesta nos 131 assassinatos de pessoas trans registrados no Brasil em 2022, tornando-nos, pelo 14º ano consecutivo, o campeão mundial de transfobia letal. Ela também está presente nos 6.430 indivíduos mortos pela polícia civil e militar no país durante o último ano, sendo a maioria das vítimas negras e moradoras de favela. Essa mesma cultura de ódio também é vista nos 1.437 casos de feminicídio no mesmo período.

A realidade é que, declarada ou não, vivemos no Brasil e no mundo um cenário generalizado de guerra, violência e opressão, e aqueles que hoje sofrem em silêncio, amanhã podem reagir de formas que não podemos controlar.

Portanto, diante de tanta dor e violência que testemunhamos ao abrir os jornais e portais de notícias, devemos nos perguntar: “Como podemos levar um pouco mais de amor para essa sociedade tão doente?” E digo “amor” não como uma máxima de redes sociais “mais amor, por favor”, mas sim no sentido que bell hooks nos apresenta como uma ética amorosa, que, segundo ela, é capaz de gerar verdadeiras revoluções.

É preciso que, mais uma vez, assumamos a responsabilidade por combater essa cultura de violência que nos cerca, levando o amor como resposta transformadora. Não é um caminho fácil, mas parece ser o único possível.

Victória Dandara é travesti, cria da zona leste de São Paulo (SP), pesquisadora em direitos humanos, advogada transfeminista e filha de Oyá. Foi uma das primeiras travestis a se graduar em direito na USP e hoje luta não só pela inclusão da população trans e travesti, mas por uma emancipação coletiva a partir da periferia e da favela.

Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

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