Para advogada, a expectativa é que o caso de Luana Barbosa vá a júri popular

Cerca de 80 manifestantes, de São Paulo e Ribeirão Preto, acompanharam a audiência de julgamento e instrução; nova audiência será marcada para a juíza ouvir as demais testemunhas e decidir os rumos do caso

Por Semayat S. Oliveira

19|07|2018

Alterado em 19|07|2018

Texto: Semayat Oliveira e Pedro Borges
Fotos: Semayat Oliveira e Pedro Borges
Advogados da família de Luana Barbosa saíram da primeira audiência de instrução com impressão positiva sobre o julgamento e com a expectativa de que o caso seguirá para júri popular. Depois da juíza Martha Rodrigues Moreira ouvir parte das testemunhas, no dia 18 de Julho, a partir das 13h, no Fórum de Ribeirão Preto-SP, nova audiência será marcada para colher os depoimentos restantes e definir se o processo irá para júri popular ou não.
Dina Alves, uma das advogadas do caso e coordenadora do departamento de justiça e segurança pública do IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), em entrevista ao Alma Preta e o Nós, Mulheres da Periferia disse que “A expectativa é que os policiais sejam encaminhados para júri popular”.
Presidenta da Casa da Mulher de Ribeirão Preto, Ádria Maria Ferreira, reiterou a expectativa e a importância de um júri popular para analisar o espancamento de Luana Barbosa, de autoria dos policiais Douglas Luiz de Paula, André Donizete Camilo e Fábio Donizeti Pultz.
“O que a gente tem percebido, acompanhando outros casos que foram encaminhados para o júri popular, é que se culpa, justamente, aqueles que transgrediram a lei. O júri popular também pode ser pressionado pela sociedade civil e por isso é importante continuarmos mobilizados”.

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Ádria Maria Ferreira durante a manifestação do dia 18 de julho

©Pedro Borges


O advogado Daniel Rondi, um dos responsáveis por acompanhar o caso, explica quais caminhos o processo pode tomar, se a juíza optar por não levar o fato a júri popular.
“Se ele entender que não é um crime de competência do júri, ele mesmo pode decidir, e aplicar uma outra medida aos réus. Se ele entender que é um crime de lesão corporal, seguida de morte, por exemplo, ele decide e não manda para júri popular”.
Além de determinar pena mais branda, como a de lesão corporal seguida de morte, a juíza também pode absolver os réus. Em ambos os casos, a família pode recorrer da decisão.
A audiência
De acordo com Flávia Meziara, advogada que acompanha o processo desde o início, a estratégia utilizada pelos advogados dos policiais foi a de fazer as testemunhas de Luana Barbosa, como Roseli Barbosa, irmã da vítima, entrarem em contradição.
“A estratégia dos advogados de defesa foi a de tentar fazer a família entrar em contradição, mas os depoimentos, por estarem falando a verdade, foram muito bons”, afirma.
Fábio de Jesus Silva, presidente do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual de Ribeirão Preto, acompanhou e detalhou a pressão feita pelos advogados dos policiais sobre a família de Luana.
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A poeta Formiga, de São Paulo, durante o ato

©Semayat Oliveira


“A defesa pegou pesado, principalmente com o filho da Luana. Achei uma falta de respeito o que eles fizeram com o filho dela. […] Eles torturaram a Roseli também, pois ela entrou em prantos e a juíza teve de parar o julgamento para ela se acalmar”.
A ausência do depoimento em sigilo de outras testemunhas, como os vizinhos que acompanharam o espancamento de Luana Barbosa, e dos vídeos gravados no dia documentando os ferimentos da vítima, chamaram atenção dos advogados.
“Primeiro vamos ver o que aconteceu, porque são os depoimentos das testemunhas protegidas, desclassificando a tese de que seria crime culposo [sem intenção de matar]”.
Caso os arquivos tenham sido apagados, os advogados organizam uma denúncia em âmbito nacional e internacional a órgãos de direitos humanos.
Para além da checagem dos arquivos que não constaram na apresentação, o seguinte passo é aguardar a data da próxima audiência de instrução e julgamento para decidir se o processo será encaminhado para júri popular, ou não.
Mobilização
Diversos coletivos negros, feministas, LGBTs se organizaram para participar do ato em frente à audiência do dia 18 de Julho, no Fórum de Ribeirão Preto. Cerca de 40 pessoas vieram de São Paulo e outras 40 da região compuseram a manifestação, que perdurou durante toda a audiência.
Marcelo Domingues, integrante do coletivo Nenhuma Luana a Menos, explicou a diversidade das organizações que compõem os atos de resistência em Ribeirão Preto.

“O coletivo Nenhuma Luana a Menos existe desde que aconteceu o fato e vem se mobilizando para dar mais voz ao caso. Tem o movimento negro da cidade, os coletivos de juventude e grupos ligados à esquerda. É muito importante a gente estar todos aqui”.
Dina Alves reitera a importância de nova mobilização dos coletivos de São Paulo e Ribeirão Preto para a próxima audiência, com a data a ser definida.
“Vamos ter outra audiência e precisamos da mobilização das militância para ir de novo. Foi muito importante o que houve hoje em termos de apoio”.
Entenda o caso
Negra, lésbica e moradora da periferia, Luana Barbosa foi abordada por policiais militares na periferia de Ribeirão Preto quando levava seu filho, de 14 anos, à aula de informática. A vítima foi espancada após solicitar presença policial feminina para ser revistada – o procedimento para revista feminina é recomendado pela legislação brasileira.
Depois de ter sido agredida durante a abordagem, a mulher foi encaminhada à Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas (HC-UE), mas morreu cinco dias após o episódio.
De acordo com laudo do IML (Instituto Médico Legal), Luana morreu em consequência de isquemia cerebral e traumatismo crânio-encefálico resultantes do espancamento sofrido.
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A expectativa de ativistas e da advogada que acompanha o caso, é que a definição seja o júri popular

©Pedro Borges


A sessão de 18 de julho é resultado de processo que se desencadeou poucos após o caso completar dois anos, em 8 de abril, e do Alma Preta preparar duas reportagens especiais sobre a morte: uma que fazia um balanço do caso, outra que denunciava a volta de um dos PMs acusados para trabalhar na rua.
Em 18 de abril, a Polícia Civil de Ribeirão Preto finalizou inquérito policial com a conclusão de que houve “lesão corporal seguida de morte”. Um dia depois, os três policiais tiveram a prisão solicitada pelo promotor de justiça Eliseu Berardo Gonçalves.
Em decisão publicada em 9 de maio, o juiz José Roberto Bernardi Liberal negou o pedido de prisão preventiva dos três policiais militares, com a justificativa de não haver elementos para a prisão dos policiais. O magistrado solicitou também audiência de instrução, que aconteceu em 18 de julho, no Fórum de Ribeirão Preto.