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Cashback do povo e novos impostos? Entenda a reforma tributária em 3 pontos

O Nós, mulheres da periferia conversou com a economista Dirlene Silva para elucidar os principais pontos da reforma tributária e seus impactos para a população mais pobre

Por Beatriz de Oliveira

21|07|2023

Alterado em 21|07|2023

Propondo a simplificação de impostos sobre consumo, a reforma tributária foi aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 6 de julho. O próximo passo é uma votação no Senado Federal. Mas o que muda caso o projeto entre em vigor? Para explicar como a reforma deve impactar a vida da população, o Nós, mulheres da periferia responde a três perguntas sobre o tema.

Confira!

Por que o Brasil precisa de uma reforma tributária? 

O Brasil tem hoje uma grande quantidade de impostos e regras tributárias complexas que prejudicam em maior grau as pessoas com menos dinheiro. “O sistema tributário brasileiro é um dos mais complicados do mundo”, explica Dirlene Silva, economista, mestra em Gestão e Negócios, e fundadora da DS Estratégias, uma consultoria financeira. 

mulher negra de braços cruzados

Dirlene Silva é economista e mestra em Gestão e Negócios

©arquivo pessoal

“Temos impostos em cascata: um vai incidindo sobre o outro. O sistema é também regressivo, então, teoricamente, o pobre  paga o mesmo imposto que o rico. É uma matriz muito cruel”, afirma. 

Somado a isso, existe a ampla criação de novas normas sobre impostos, há mudanças constantes nesse meio. De acordo com pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), de 1988 até 2016, o país criou 363 mil normas tributárias. Isso resulta numa média de 1,88 regras tributárias por hora em um dia útil.

A discussão por uma mudança no sistema tributário do país é antiga. O tema está presente no Congresso Nacional há pelo menos três décadas. Por isso, a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019 pela Câmara – que define a primeira fase da reforma tributária – foi considerada um passo histórico.

Como vai funcionar? 

A principal mudança proposta pela reforma tributária é a substituição de cinco impostos. Três deles são federais: Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). No lugar desses tributos, entra a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).

Os outros dois impostos a serem substituídos são: Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Nesse caso, o novo tributo será o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Essas mudanças, que abrangem mercadorias e serviços, vão eliminar a cobrança de impostos em cascata. Também inibem as guerras fiscais entre estados.

“Os estados têm alíquotas variadas, alguns dão isenções e benefícios fiscais, isso gera uma guerra fiscal entre um estado ou outro. Por exemplo, houve casos de empresas que saíram aqui do Rio Grande do Sul para estados do nordeste por causa de benefícios fiscais”, explica Dirlene.

A alíquota dos novos impostos ainda não está definida. Mas, o governo estipulou que ela será diminuída em 60% para categorias como: serviços de transporte coletivo, dispositivos médicos, medicamentos e produtos de cuidados à saúde menstrual, produções culturais, serviços de saúde e educação.

Há ainda itens que terão alíquota zero do imposto, é o caso de medicamentos para tratamento de doenças graves e alimentos da cesta básica, os quais ainda serão definidos por lei complementar, já que atualmente cada estado tem a sua composição.

Outras alterações previstas no projeto são a desoneração de exportações e investimentos e a criação do Imposto Seletivo (IS), que será cobrado em produtos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente, de modo a desestimular este comércio.

Caso seja aprovada, a reforma tributária começa a valer em 2026, num período de transição até 2032. Sendo assim, as novas regras só serão totalmente aplicadas em 2033.

A reforma beneficia os mais pobres? 

Para a economista Dirlene Silva, apesar da reforma simplificar os tributos, deixa de lado o combate à desigualdade social, que é reforçado pelo sistema tributário atual. “A reforma tributária deixa a desejar em vários pontos, o principal é que se esperava uma maior tributação sobre patrimônio e renda”, diz.

Segundo pesquisa publicada em 2014 pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), os tributos pesam mais para mulheres e negros. O estudo apontou que 10% da população mais pobre compromete 32% da renda com impostos.

Já os 10% mais ricos, gastam 21%. Dentro desse recorte de mas pobres, 68% sao negros e 54% são mulheres. Na faixa dos mais ricos, 83% são brancos e 62% são homens.

Mesmo sem ter como foco a diminuição das desigualdades de renda do país, a reforma tributária traz benefícios à população mais pobre. Um deles é o cashback do povo, que se trata de uma devolução de parte dos impostos pagos por famílias de baixa renda.

Dados publicados pelo governo federal estimam que a medida vai ser positiva para 72 milhões de brasileiros mais pobres, compostos por 72% de negros e 57% de mulheres. Ainda não há definição de como essa devolução de valores ocorrerá.

A desoneração da cesta básica é outro ponto da reforma pensado para os mais pobres. “Quem consome mais a cesta básica são os mais pobres. Isentar esses itens para os mais ricos não vai fazer grande diferença, mas para os mais pobres sim”, aponta a economista.

Segundo o governo federal, com a reforma tributária, mais empresas estarão dispostas a investir no país, pois haverá uma diminuição do chamado “custo Brasil”, alto valor pago em impostos.

Por consequência, surgirão mais oportunidades de trabalho. A estimativa é de 12 milhões novos empregos em 15 anos. Nesse mesmo período, a previsão é de um crescimento de 12% no Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país.