Mulher negra e idosa, com cabelos pretos curtos, vestindo blusa preta e saia verde escura

Boteco da Dona Tati, em SP: a mulher por trás das rodas de samba

Conheça a história da dona do boteco que anima a zona oeste paulistana com rodas de samba

Por Beatriz de Oliveira

21|05|2024

Alterado em 21|05|2024

Numa noite de fim de semana, quem passa pela rua Rua Conselheiro Brotero, na Barra Funda, zona oeste de São Paulo (SP), encontra um estabelecimento lotado de gente curtindo um bom samba. É o Boteco da Dona Tati, cujo sucesso é tanto que nem todos os clientes cabem no espaço e alguns precisam ocupar a rua e as calçadas. 

O local é comandado por Sebastiana Alves Martins, mais conhecida como Dona Tati, e por seu filho Thiago. A senhora, que completa 68 anos em 14 de abril, se define como uma pessoa  “curta e grossa”, que teve que se criar sozinha e  não consegue dimensionar o legado criado  pelo  o boteco que leva seu nome. 

Nascida em Estrela d’Oeste (SP), Dona Tati se mudou para a capital paulista aos 13 anos para trabalhar como doméstica. Nunca havia pensado em trabalhar com um bar – na verdade, queria distância de bebidas alcoólicas devido a casos de vícios na família. Mas após um tempo comandando uma rotisseria, que abriu em 2001, teve que oferecer bebidas para continuar tendo clientes. 

Com isso, “vinham uns tiozinhos e falavam ‘oi tia, me dá uma cachaça’ e eu respondia ‘tia é o caralho’”, lembra. Foi então que seu filho criou uma placa com o nome: Boteco da Dona Tati. “Mais tarde, eu patenteei esse nome antes que ficasse famoso”. 

A partir daí, o estabelecimento passou a oferecer também almoço e música ao vivo, a pedido dos clientes. Os ritmos eram variados: um dia era forró, no outro MPB, até que uma sambista pediu à empreendedora para ensaiar no bar com seu grupo. Foi ali, em 2017, que o samba tomou conta do boteco.

Também nessa época, o filho Thiago assumiu a direção do espaço junto com  Dona Tati. Incluiu hambúrgueres artesanais no cardápio e convidou nomes da velha guarda do samba, como Nelson Rufino, para se apresentar no boteco. As escolhas foram certeiras e o movimento do boteco cresceu tanto que as pessoas fechavam a rua para participar das rodas de samba. 

O espaço em que estavam há 15 anos ficou pequeno e Thiago sugeriu se mudar para outro maior, com  pouco mais de 100m². Após três anos no novo lugar, foi preciso buscar um com ainda mais espaço, dessa vez com  mais de 250m², na esquina da Rua Conselheiro Brotero, onde o boteco está localizado hoje. 

Apesar de Dona Tati ter achado “gigante” quando viu pela primeira vez, o espaço já não suporta o tamanho do público  que vai até lá curtir um samba. Agora, ela e o filho procuram um galpão para abrigar o empreendimento. Enquanto isso, administram também o Botequim Canela Preta, também localizado na Barra Funda, inaugurado em 2023. 

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© Renato Milagres

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Sebastiana Martins, a mulher por trás do Boteco Dona Tati © Renato Milagres

© Folha de S. Paulo

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Roda de Samba do Boteco da Dona Tati, em SP © Renato Milagres

A ‘pedra não lapidada’ que criou um legado

Dona Tati define seu boteco como um lugar sagrado, onde passa a maior parte de seu tempo. “Vem tanta gente, de lugares e personalidades diferentes, aí você olha e parece uma grande família, é uma energia pairada no ar”, diz.  

A empresária conta que lidera a equipe e o empreendimento do “seu jeitinho” e que é essa correria que a faz viver. “Se eu não tivesse o bar para trabalhar, talvez eu tivesse dentro de casa numa depressão pela perda do meu filho Ricardo aos 36 anos, que eu não aceito até hoje”, desabafa. 

“Eu não sou aquela mulher fina que as pessoas esperam, eu sou uma mulher que ralou, uma criança que sobreviveu nessa selva de pedra, lutei e cheguei onde estou. Tem gente que se surpreende ao saber que a Dona Tati é uma baixinha, gordinha e preta. Outras esperam que a Dona Tati seja elegante e esteja em cima do salto. Eu sou uma mulher humilde”. 

Mesmo diante dos elogios e depoimentos que recebe sobre o Boteco da Dona Tati, a senhora não sabe o tamanho do que construiu com o seu trabalho dimensionar o tamanho do seu legado. “Eu ainda não tenho essa noção de quem é a Dona Tati, eu vivo no meu mundo e ele é pequeno”. Grande que é, o legado de Dona Tati ultrapassa as medidas de seu pequeno mundo.