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Anna Suav: quando a rima encontra o canto e a melodia

Ela é poeta, slammer, ex-dançarina, jornalista, rapper e nunca sonhou em cantar. Hoje, é referência no rap

Por Mariana Oliveira

22|12|2022

Alterado em 22|12|2022

Quem vê Anna Suav atualmente como uma referência no rap e no slam, mal pode imaginar que foi longe da poesia que iniciou a trilhar sua carreira. A manauara Anna Carolina, artisticamente conhecida como Anna Suav, tinha o sonho de brilhar na Broadway e começou no ballet ainda na infância.

“Eu fiz dança por um ano em projeto do Governo, em Manaus. Me destaquei e consegui uma bolsa em uma escola de dança. Fui bailarina por 11 anos, praticava de segunda a segunda. A dança era a minha paixão”.

Conta ter aprendido muito sobre figurino, maquiagem, presença de palco e disciplina. Com o passar dos anos, não se identificava naquele ambiente. Durante o terceiro ano do ensino médio, com a “realidade batendo na porta”, percebeu que não poderia viver da dança. Com esse sentimento somado a uma lesão, desistiu de continuar. “A dança foi uma grande escola para mim, mas eu precisava fazer alguma coisa que garantisse meu futuro”.

Sempre gostou de desafios e não poderia ser diferente durante a faculdade. No curso de jornalismo, Anna foi representante de turma. Enquanto membro do centro acadêmico, pode se aproximar de projetos da instituição.

Nessa relação, conheceu um programa de bolsas de mobilidade regional, foi selecionada e garantiu uma bolsa para estudar durante seis meses na UFPA (Universidade Federal do Pará), em Belém (PA).

Durante o programa se aproximou da cultura hip-hop. “Até então eu não conhecia o movimento. E quando cheguei lá, minha cabeça explodiu, isso é a periferia”. De volta a Manaus, com uma rica bagagem de conhecimentos e inquietações, passou a frequentar batalhas de rima.

“Sentia uma lacuna sobre gênero. Os ‘caras’ eram super machistas, eu ficava revoltada porque saía de casa para assistir aquilo. Era horrível”.

A partir das péssimas experiências em slams regionais, decidiu buscar por mulheres com a mesma visão. “Gostaria de criar uma batalha de rap só com mulheres”.

Desse desejo surgiram alguns problemas, ela não tinha o hábito de escrever rimas e não sabia como começar. “Eu achava bizarro como as pessoas conseguiam fazer uma música que rimavam e davam compasso”.

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Aprendendo sobre a cultura hip hop, Anna Suav começou a participar de slams

©Kleber José

Navegando na internet se aproximou de escritoras contemporâneas, como a poeta Mel Duarte, e assim desenvolveu sua escrita poética. “Se eu falar que conhecia Conceição Evaristo ou Carolina Maria de Jesus, estarei mentindo. Não fui apresentada a essa literatura. Consumi uma poesia muito contemporânea, hoje a Mel é minha amiga pessoal”.

Anna entende a escrita como algo presente desde cedo na vida das meninas, mas como forma de internalizar afetos. “Nós, mulheres, somos incentivadas desde pequenas a não falar sobre o que pensamos. Normalmente ganhamos um diário para guardar nossos sentimentos em um caderninho”. Atualmente utiliza a poesia como resistência.

Com maior convívio e aprendizado no slam, reuniu mulheres por meio do Facebook. Assim, em 2017, nasceu o ‘Slam Dandaras do Norte’. O primeiro grupo formado exclusivamente por e para mulheres negras falarem sobre rap, poesia e emoçoes.

“O slam é justamente a coisa subversiva, de que é possível fazer poesia com uma linguagem que é nossa. Nesse espaço pego o microfone e esqueço até meu nome”.

Ampliando sua rede de contatos, surge a amizade com Bruna BG. Não esperava, mas desse encontro, mais uma mudança entraria em seu caminho: o canto. “Por incentivo da Bruna eu comecei a cantar. Ela me convidou para participar de um grupo que tinha na época. E passamos a compor juntas”.

Sua relação com a música começou em casa, por influência do pai. “Venho de uma família que não tem recurso financeiro, mas que me apresentou à arte”. Lembra de ouvir discos de flashback dos anos de 1970 e 1980 com o pai todas as sextas-feiras. “Ele foi me educando musicalmente sem querer”.

Inexperiente no canto, acredita que a vivência da dança facilitou a integração de mais uma vertente artística em seu dia a dia. “Quando você encontra uma pessoa similar a você, tudo se torna mais palpável”.

Seja na dança, escrita ou canto, Anna reforça que sente o mesmo carinho e consideração por toda arte que faz.

“Na minha história, a poesia não está ou acima ou abaixo da minha música”.

Defende seus trabalhos como espaço aberto para mulheres falarem, ouvirem e se sentirem seguras, mas também é seu próprio porto-seguro. “Antes eu não tinha autoconfiança para considerar minha fala como importante”.

Garante que tudo que conquistou é “apenas o começo”, e reconhece que seu nome é um marco na poesia e música nacional, principalmente para a sua cidade natal. “Me sinto uma das representantes da minha região. Acredito que existe uma história escrita e tenho muito orgulho disso. Será preciso uma boa dose de desonestidade para falar sobre slam, poesia feita por mulheres e sobre rap, e não citar meu nome.”