‘A braba do entrelace’: conheça a história da criadora do Mulambo Hair
Gabriele Moura encontrou força e autoconhecimento nas diversas possibilidades que o cabelo da mulher preta pode ter.
Por Mariana Oliveira
23|11|2022
Alterado em 09|12|2022
Mulambo Hair é um salão especializado em entrelace, megahair e box braids, localizado no Largo do Paissandu, região central de São Paulo (SP). O salão foi criado a partir da técnica de entrelace por repartição desenvolvida por Gabriele Moura, a “braba do entrelace”, e o sonho de proporcionar melhor autoestima para mulheres negras.
Entrelace é uma técnica em que o profissional trança os cabelos rente a raiz, para aplicar fibra sintética. No megahair, o cabelo sintético é aplicado junto ao natural para aumentar o comprimento e volume. Já as box braids, também conhecidas como penteados protetores, são tranças feitas desde a raiz do cabelo, com aplicação de fibra sintética ao cabelo natural.
“O megahair me encontrou”
A técnica em turismo e hotelaria, nunca sonhou em trabalhar com cabelo. Aos 20 anos, durante estágio na Casa de Cultura da Mulher Negra, em Santos, litoral de São Paulo, aprendeu sobre a cultura negra e se apaixonou. Vivendo em uma família miscigenada e de maioria branca, pôde compreender e se apropriar de sua negritude apenas nessa fase da vida.
Realizou um curso de tranças na Casa e em pouco tempo foi convidada para ministrar as aulas. “Eu era iniciante, não tinha feito o cabelo de ninguém, mas nesse momento eu aprendi o que realmente gostava”, conta Gabriele.
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Com o aperfeiçoamento, fez um curso de tranças ofertado por Chris Oliveira, cabeleireira referência em cabelos crespos e cacheados em São Paulo (SP). “Foi muito louco ver pessoas de diferentes estados sonhando como eu. Era totalmente fora da minha realidade”. No final do período, foi convidada para ser cabeleireira no local. Sem pensar duas vezes juntou suas coisas e alugou um cômodo na capital. “Era a primeira vez que eu vivia algo que fazia sentido para mim”.
Com o tempo se percebeu limitada, desejava ousar mais, testar novas técnicas e alcançar novos públicos. Foi então que saiu do salão. Para se manter, postava seus trabalhos em grupos no Facebook, e por três anos rodou pela cidade atendendo a domicílio até alugar cadeiras em salões até sonhar com um espaço só seu. “Queria proporcionar um espaço melhor. Notei que minhas clientes tinham um perfil parecido com o meu: uma coisa mais reservada, um espaço com tranquilidade e silêncio”.
O título de “braba do entrelace” é uma síntese de seu aperfeiçoamento no ofício. Trabalhando com megahair em 2014, observava com desconforto o acabamento dos apliques, assim testou em si mesma possíveis formas de aplicação que fossem discretas e com aspecto de cabelo natural. “Eu coloquei em mim e todos achavam que era meu cabelo. Tenho clientes fiéis porque a galera procura minha técnica”.
Seu trabalho alcançou novos públicos, mas nem sempre foi assim, sua trajetória é marcada pela dificuldade de lidar com o próprio sucesso. Nascida na Área Continental de São Vicente, litoral de São Paulo, após a separação dos pais, quando ainda tinha cinco anos, viveu de modo instável, morando em diversas casas. Com a mãe, com os avós, tios ou tias, sempre envolta de pouco afeto. Para completar, sofria bullying na escola, o que afetou profundamente sua autoestima. Revela ainda sofrer com a falta de suporte da família. “Eu escuto todos os dias que já fui longe até demais”.
Sem expectativa de um futuro próspero como o vivido hoje, Gabi sempre acreditou na filosofia de se esforçar ao máximo para conseguir o mínimo. “Eu me matava todos os dias, vivia coisas que não queria, mas achava que tinha que viver aquilo, e a vida não me provou o contrário”, conta.
Criou sua rede de apoio com mulheres que conheceu durante a jornada e, principalmente, na espiritualidade. “Se eu acordar e não me autoafirmar diariamente, não consigo existir naquele dia”. Ela explica ter conhecido afeto através da espiritualidade e dessa forma abriu o Mulambo Hair em referência à Maria Mulambo (falange de pomba gira na Umbanda). “Se hoje estou onde estou, é porque eles estavam comigo, não tinha como abrir meu espaço e não homenageá-la”.
Com uma trajetória de luta individual, Gabriele só pensa em “crescer cada dia mais” e partilhar seus conhecimentos e experiências com mais mulheres.
“Eu amo meu trabalho não só pelo cabelo, mas pela conexão que crio com diversas mulheres”.
Tem planos divididos em duas esferas: a criação de uma sala de cursos no salão – que deve estar em funcionamento ainda em novembro – e um projeto de retomada ao local onde cresceu, em que deseja profissionalizar mulheres de Santos e São Vicente com cursos de formação de trancista.
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