Obrigada, Glória Maria: 5 vezes em que a jornalista fez história
Marco do jornalismo brasileiro, Glória Maria morreu na manhã desta quinta-feira (02). Selecionamos momentos importantes de sua carreira. Confira!
Por Beatriz de Oliveira
02|02|2023
Alterado em 02|02|2023
Glória Maria, a jornalista que marcou a história do jornalismo e da televisão brasileira, morreu na manhã desta quinta-feira , 2 de fevereiro, no Rio de Janeiro.
Em 2019, Glória foi diagnosticada com um câncer de pulmão. O tratamento com imunoterapia teve sucesso. Depois, ela sofreu metástase no cérebro, que também pôde, inicialmente, ser tratada com êxito por meio de cirurgia, mas os novos tratamentos não avançaram.
Conhecida por suas reportagens especiais pela Europa, África, e Oriente e entrevistas com celebridades, Glória Maria foi referência para a população negra brasileira. Apresentou o programa “Fantástico” da Rede Globo de 1998 a 2007, período em que viajou para mais de 100 países. Em 2010, passou a fazer parte da equipe do “Globo Repórter”.
Viagens faziam parte também de seus projetos pessoais. No fim dos anos 2000, Glória Maria trabalhou como voluntária na Índia e na Nigéria. Também nesse período, adotou suas filhas Maria e Laura.
Eu sou uma pessoa movida pela curiosidade e pelo susto. Se eu parar pra pensar racionalmente, não faço nada. Tenho que perder a racionalidade pra ir, deixar a curiosidade e o medo me levarem, que aí eu faço qualquer coisa.
Com pai alfaiate e mãe dona de casa, a carioca frequentou colégios públicos e buscou formações complementares, estudou inglês, francês e costumava ter êxito nos concursos de redação da escola. Formou-se em Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio).
Em 1970, foi levada por uma amiga para ser rádio-escuta da Globo do Rio de Janeiro. No ano seguinte, estreou como primeira repórter negra da emissora na cobertura do desabamento do Elevado Paulo de Frontin, no Rio de Janeiro.
A partir daí, Glória Maria passou a colecionar coberturas históricas, como a guerra das Malvinas (1982) e os Jogos Olímpicos de Atlanta (1996). Mostrou aos telespectadores cultura de diversos países, como em 2012, quando foi ao Oásis da paz em Omã e fez um passeio com camelos pelo deserto, e em 2015, quando foi a Marrocos e reportou os encantadores de serpente e a colheita do argan – óleo extraído de sementes secas – feita por cabras.
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Passou ainda por inúmeros perrengues, como ser roubada e abandonada no meio do caminho com o cinegrafista, fato que aconteceu na Nigéria. Episódios de racismo também fizeram parte de sua trajetória, como das vezes em que João Figueiredo, presidente do período da ditadura militar, dizia “não deixa aquela neguinha chegar perto de mim” quando a via.
“Desde que eu era pequena, sempre soube que ia vivenciar e enfrentar o racismo. Eu já vivia isso na rua em que eu morava, que só tinha brancos. No Primário, tinham quatro amigas negras como eu. No Ginásio, só tinha duas ou três. No Clássico, só tinha uma. Na faculdade, só tinha eu. (…) Tive atitudes de enfrentamento, eu sabia que ia passar por aquilo tudo e tinha que fazer alguma coisa, e isso era não vou aceitar as cascas de banana que colocam no meu caminho. Eu não tive referência, não tive em quem me espelhar”, disse em entrevista ao podcast Mano a Mano.
Obrigada, Glória Maria. Você foi referência para nós, mulheres negras e das periferias.
Para se inspirar e relembrar, confira 5 vezes em que Glória Maria fez história
1. Foi a primeira repórter a entrar ao vivo e a cores
Glória Maria foi a primeira repórter a fazer uma entrada ao vivo e em cores. O fato aconteceu em 1977, durante o Jornal Nacional. Como se não bastasse a emoção do momento, a lâmpada do equipamento queimou e a jornalista teve que acender o farol do carro de reportagem e fazer a entrada ao vivo ajoelhada.
Além disso, em 2007, a carioca realizou a primeira transmissão em HD da televisão brasileira, com reportagem sobre a festa do pequi, fruta adorada pelo povo Kamaiurás, no Alto Xingu.
2. Foi a primeira brasileira a usar a Lei Afonso Arinos
Em entrevista à Revista Tpm, Glória Maria contou que foi a primeira pessoa a usar a Lei Afonso Arinos, primeira lei do país que considerou discriminação racial como contravenção penal, criada na década de 1950. “O gerente de um hotel tentou me proibir de entrar pela porta da frente. Aí chamei a polícia. Foi quando percebi que tudo o que eu tinha tentado aprender na minha vida deu resultado”, contou.
3. Participou de ritual rastafari e experimentou maconha na TV
“Aqui na Jamaica, é permitido por lei fumar maconha para fins religiosos. A ganja é usada em muitos rituais rastafaris”, conta Glória Maria em reportagem exibida em 2016. Na ocasião, viajou até o país caribenho, participou de ritual rastafari e fumou o cachimbo com maconha.
4. Foi a primeira mulher brasileira a cobrir uma guerra
Em 1982, Glória Maria cobriu a Guerra das Malvinas, conflito armado entre a Argentina e o Reino Unido ocorrido nas Ilhas Malvinas. Se tornou então a primeira jornalista do país a cobrir uma guerra. Foi ela quem pediu ao diretor do Jornal Nacional à época, para ir.
Outro conflito que a repórter cobriu foi a invasão da embaixada brasileira do Peru por um grupo terrorista, em 1996.
5. Fez entrevistas marcantes com personalidades importantes do mundo todo
Além das reportagens históricas, Glória Maria também acumulou entrevistas marcantes com celebridades, como Michael Jackson, Harrison Ford, Nicole Kidman, Leonardo Di Caprio e Madonna.
Sobre a conversa com Madonna, com quem tinha apenas quatro minutos, contou que foi sincera e disse à cantora que estava nervosa e iria errar o inglês. Como resposta, Madonna disse à equipe que Glória teria o tempo que precisasse.
Outra passagem simbólica foi em 1996, com Michael Jackson durante as gravações do clipe They Don’t Care About Us, no Rio de Janeiro. Após insistir em uma entrevista com o cantor, ele disse que amava o Brasil e deu-lhe um beijo na testa.