Literatura negra, escritora, microfone

Esmeralda Ribeiro: a vida e a trajetória da autora afro-brasileira

Escritora há mais de 40 anos, Esmeralda Ribeiro usa a literatura negra como resistência e porta de entrada para novas gerações de autoras

Por Mariana Oliveira

17|11|2022

Alterado em 17|11|2022

Conhecida principalmente por ser uma das integrantes do Coletivo Flores de Baobá e organizadora dos ‘Cadernos Negros’ (coletânea de contos e poemas afro-brasileiros). A escritora e jornalista Esmeralda Ribeiro considera sua principal missão apoiar mulheres a conquistar espaços na literatura negra. Quem hoje vê a potência crítica de seus textos, pode não saber que sua trajetória na literatura iniciou ainda na década de 80, na universidade.

Pouco antes de entrar na faculdade, abalada com o falecimento do pai, encontrou na escrita uma forma de amenizar sua dor. “Escrevi um poema para trabalhar o luto”, conta. Estudante de escola pública e com poucos recursos financeiros, se matriculou no curso de relações públicas (optou pelo jornalismo ao longo dos semestres) em uma universidade em Mogi das Cruzes (SP), a única que cabia no orçamento da família. Com apenas sua mãe para sustentar a casa, recolhiam alimentos deixados por feirantes e Esmeralda começou a trabalhar para ajudar na mensalidade da graduação.

A escritora relembra com nostalgia o trajeto de casa até a faculdade. “Não tinha vários transportes como hoje, eu pegava o trem dos estudantes às 6:08”. Costumava utilizar o terceiro vagão junto com colegas negros. Sexta-feira era dia de festa, a gente fazia um ‘sambão’”. À medida que o período era marcado pela farra, também haviam contratempos. A linha Brás-Mogi das Cruzes era conhecida pelos relatos de violência, portanto era mais seguro se manterem unidos.

Na vivência nos trens, conheceu Marinete Silva, companheira do escritor Luiz (Cuti) Silva. Com a amizade formada, Cuti apresentou a ela os ‘Cadernos Negros’, já na quarta edição. Ao entrar para o Quilombhoje (coletivo cultural e editora responsável pela publicação dos Cadernos), Esmeralda tomou consciência da estrutura racista da sociedade.

“Fui lembrando que sempre sofri racismo, mas não me entendia como uma pessoa negra”.

O convívio no coletivo permitiu aproximação com outros escritores negros. A partir do “Caderno volume 5” conheci outros escritores, entendi como o racismo funcionava no Brasil e como era ser mulher negra escritora. Tudo foi uma batalha”.

Mesmo com a rede de apoio formada sentiu (e sente) resistência entre os autores mais antigos. “Tem pessoas mais experientes que não aceitam novos nomes, têm medo de perder o posto de privilégio da escrita”.

O sol é para todos

O letramento racial nunca foi constante em sua vida. Somente após de entrar para o “Cadernos Negros” soube nomear pequenas violências que ela e a família sofriam: a discriminação social e o racismo. “Eu nunca militei dentro da universidade, não tinha espaço. Você sai de lá apenas com leituras brancas, meu preparo foi paralelo à universidade: foi o ‘Cadernos’, foram as pessoas mais experientes que me ensinaram”

Para Esmeralda, seguir carreira no jornalismo após a formação é difícil e com a questão de raça e gênero incluídas, as dificuldades só aumentam. “Nós negros, não temos esse tempo, porque tínhamos de trabalhar para sobreviver”. Esmeralda recebeu seu primeiro prêmio literário no trabalho formal. Na ocasião, a empresa abriu um concurso interno para os funcionários enviarem textos e poesias. O vencedor teria seu escrito publicado no folhetim da empresa. Esmeralda venceu, levou para casa uma caneta-relógio, prêmio simbólico, mas importante para mostrar que estava no caminho certo.

Com mais de 40 anos de carreira, assim como foi apresentada às pessoas, convidada a participar de grupos e encontros, Esmeralda indica e une mais mulheres negras escritoras nos espaços que frequenta.

“Eu não me sinto ameaçada, o sol está brilhando e todo mundo tem direito de pegar um pouquinho desse brilho. Não é só porque eu consegui tudo deve vir para mim, devem ter outras [mulheres]”.

Seus textos retratam principalmente a escrita feminina com o objetivo de divulgar e incentivar maior participação da mulher negra na literatura. A partir dessa inquietação, foi uma das responsáveis por reunir mais de 400 mulheres escritoras nas escadarias da rua 13 de maio, no bairro do Bixiga, para a realização de uma foto histórica. Hoje também promove eventos e ações como o Sarau Afro Mix, realizado na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo