‘Não é sobre cor, é cultura’: a importância do cinema negro
Filmes dirigidos e protagonizados por pessoas negras mobilizam milhares de espectadores. Confira a análise da jornalista Mariana Oliveira.
23|11|2022
- Alterado em 17|05|2024
Por Mariana Oliveira
Nos últimos anos temos visto um aumento de produções cinematográficas com protagonismo negro, sendo eles representados no elenco, produção ou direção. Porém, ao analisar a lista de blockbusters (filmes populares e que rendem muito lucro às produtoras), nenhuma das maiores bilheterias da história do cinema pautam essa diversidade.
Este foi um dos questionamentos de Viola Davis durante a estreia de “A Mulher Rei” (2022), filme estrelado, produzido e dirigido por mulheres negras. No lançamento, contou que usaria o longa como termômetro para compreender se o público busca efetivamente por representatividade nas telas. Em caso de boicote, os espectadores estariam levando uma mensagem “à máquina chamada Hollywood” de que mulheres negras não são capazes de “liderar bilheterias globalmente”.
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O que os números dizem
De acordo com a Sony Pictures, “A Mulher Rei” atingiu mais de um milhão de telespectadores no Brasil, a maior bilheteria fora dos Estados Unidos. Segundo dados divulgados pela Ancine (Agência Nacional do Cinema), nos últimos 10 anos, entre 2011 a 2021, filmes de super-heróis ficaram 34 vezes entre as dez maiores bilheterias no país. No universo de adaptação de quadrinhos, apenas em 2018, com o lançamento de “Pantera Negra”, assistimos um longa com elenco e personagens majoritariamente negros e grande destaque à personagens femininas.
“Pantera Negra” ficou durante cinco finais de semana seguidos no topo das bilheterias, rendeu U$202 milhões e uma indicação ao Oscar na categoria de melhor filme. Em 2022, com a estreia de ‘Pantera Negra: Wakanda para sempre’, esse feito pode ser repetido. A obra que chegou aos cinemas no último dia 10 de novembro já arrecadou U$330 milhões, segundo o Deadline.
A revista Variety apontou que Angela Bassett, tem “grandes chances” de ser indicada como melhor atriz coadjuvante no Oscar 2023 pela interpretação de Ramonda. Caso aconteça, ela será a primeira pessoa do Universo Cinematográfico Marvel (MCU) a ser indicada, uma marca que poderá abrir caminhos para novos nomes e empoderar quem já está no mercado.
Sem a liderança do Pantera Negra de Chadwick Boseman (o ator faleceu em 2020 em decorrência de um câncer), protetor de Wakanda, é enfatizado o comando feminino da maior nação desse universo fictício. Além disso, há o apelo intergeracional: passando pela rainha-mãe Ramonda como símbolo máximo de liderança. O exército de Doras Milaje. as novas gerações, representadas por Shuri (Letitia Wright) e Riri Willians (Dominique Thorne), ambas jovens mulheres pretas e cientistas.
No Brasil, um exemplo é o longa ‘Medida Provisória’ (2022), dirigido por Lázaro Ramos e protagonizado por Taís Araújo, Seu Jorge e Alfred Enoch. Como roteiro de ficção utópica, no filme, o governo decreta uma medida provisória que obriga cidadãos negros a “voltarem para a África”. A trama levou 237 mil espectadores ao cinema em duas semanas em cartaz.
Em setembro, Lázaro Ramos compartilhou nas redes sociais um vídeo exibindo resultados para além da bilheteria, como o número de empregos gerados direta e indiretamente. Enquanto estava em cartaz, grupos em redes sociais se mobilizaram para prestigiar o cinema negro nacional nas telonas. ‘Medida Provisória’ foi o filme brasileiro mais assistido entre os meses de abril e junho de 2022.
Portanto, em resposta ao questionamento de Viola Davis na premiére de “A Mulher Rei”, os números nacionais e internacionais e movimentações como o ocorrido em “Medida Provisória”, mostram que o público deseja consumir e, em consequência, podem ser grandes blockbusters. Cabe agora à indústria atender ao público, não apenas ampliando o número de produções, mas garantindo espaço na tradicional Academia de Artes e Ciências Cinematográficas e premiando devidamente as obras.
Mariana Oliveira Jornalista, apaixonada por cultura. Moradora da Vila Progresso, em Itaquera, zona leste de São Paulo (SP).
Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.
Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.
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