Coisas que aprendi fazendo terapia
Jornalista Beatriz de Oliveira conta sua experiência fazendo terapia em 2021 e a dificuldade de falar sobre si mesma.
Por Beatriz de Oliveira
15|12|2021
Alterado em 17|05|2024
Falar não está na curta lista das coisas que sei fazer bem. Falar sobre mim, pior ainda. Então, falar sobre meus conflitos internos e inseguranças para uma pessoa desconhecida não foi uma experiência que posso chamar de agradável.
É difícil para mim fazer terapia porque é difícil olhar para dentro e encarar os meus medos. É difícil para mim fazer terapia, porque é difícil compartilhar com outra pessoa as minhas inseguranças, já que não sou capaz de me abrir e desabafar. É difícil falar porque me sinto errada e culpada em sentir as coisas que sinto, em ter crises de ansiedade pelos motivos que tenho. Por isso, também não é fácil falar sobre mim nesse texto.
Comecei a fazer terapia em abril de 2021. A pandemia de Covid-19 e todas as suas nuances aprofundaram o meu vazio. Hesitei muito antes de marcar uma conversa com o psicólogo. E logo conversa inicial, coloquei que a minha condição de mulher negra era central dentre as inseguranças que sinto. Era o receio de iniciar uma terapia com uma pessoa que minimiza o racismo, como já vi relatado em reportagens.
Nas primeiras sessões, meus relatos eram curtos, as palavras que saiam não traduziam o que eu sentia. Os silêncios eram preenchidos pelas falas do terapeuta. As sessões que aconteciam uma vez por semana seguiram sem muitos avanços. Então, o psicólogo jogou a real: disse aquele era um espaço meu, que eu podia falar o que quisesse, sem medo.
Chegando em casa, chorei rios. A possibilidade de falar o que eu quiser causava pânico: e se o que eu falar não for importante? E se ele não entender o que eu estiver querendo dizer? Procurei refúgio no colo da minha mãe e entre os soluços vinha a frase “eu não gosto de mim”.
Passei a semana pensativa, e tentando organizar a mistura de sentimentos. Na próxima sexta-feira, às 19h, eu falei. Falei como me sentia, o que me incomodava. As palavras saíram atropeladas.
A partir do momento que consegui falar, as coisas começaram a fluir melhor. Comecei a escrever num papel o que queria falar na sessão. Isso me dá maior segurança e me ajuda a falar. O papel volta pra casa amassado e por vezes rasgado, é vítima das minhas mãos inquietas, que demonstram o meu desconforto em estar ali e em falar sobre mim.
Entre as coisas mais marcantes de fazer terapia, está descobrir fatos sobre mim saindo a partir da fala de outra pessoa. E com isso, me entender melhor. Na maior parte das vezes as descobertas não foram agradáveis, mas também me causaram alívio. Sabendo dos motivos das minhas inseguranças, é torna mais fácil lidar com elas.
Com a terapia, aprendi que falar ajuda, que é possível ter diferentes perspectivas de uma mesma situação, e que elas só vêm à tona a partir da escuta do outro. Com a terapia, aprendi que é preciso olhar para dentro e encarar quem eu sou, e o mais importante: me aceitar.
Não está tudo resolvido, em uma semana parece que vai tudo ficar bem, na seguinte parece que as coisas vão desmoronar. Mas é importante seguir falando.
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