Saúde indígena: Sesai responde às denúncias sobre amputações por acidentes ofídicos

Secretaria de Saúde Indígena afirma que vai apurar negligência em atendimento a indígenas, denunciada em série de reportagens da colunista Adriana Amâncio

04|07|2023

- Alterado em 04|07|2023

Por Adriana Amâncio

Encerrando nossa série de reportagens sobre o impacto das amputações por acidentes ofídicos em crianças indígenas isoladas, trazemos agora o posicionamento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

O órgão se pronunciou em relação às denúncias de negligência com as diretrizes da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), que estabelecem a possibilidade de adoção de procedimentos da saúde ancestral indígena e a necessidade de uma comunicação clara com os indígenas durante os procedimentos de saúde.

Nas matérias que compuseram nossa série, as fontes denunciaram os problemas e apresentaram propostas para solucionar essa questão das amputações em crianças indígenas vítimas de acidentes ofídicos.

No texto de estreia, a antropóloga Juliana Rosalem, coordenadora do Programa Wajãpi do Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (IEPÉ), destacou os problemas no atendimento às vítimas de acidente ofídico na etnia Wajãpi. Ela relatou casos em que profissionais de saúde proibiram os indígenas de adotar os primeiros socorros com base em seu sistema de saúde ancestral.

Juliana ainda mencionou que, em alguns casos, os profissionais de saúde realizam amputações mesmo contra a vontade das famílias indígenas. Segundo ela, a barreira do idioma dificulta a comunicação entre as famílias indígenas e os profissionais de saúde, o que impede que elas expressem claramente seu ponto de vista e a vontade do paciente.

Existem situações em que as famílias acreditam que a amputação não é necessária e desejam apresentar alternativas que combinem seus conhecimentos com os dos profissionais de saúde, mas a dificuldade na comunicação acaba resultando na amputação.

Em relação ao respeito ao uso de práticas de saúde do sistema ancestral, a assessoria de comunicação do Ministério da Saúde informou que está realizando uma apuração junto ao DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena) Amapá para verificar se as normativas foram seguidas conforme as determinações estabelecidas.

De acordo com o e-mail, o órgão enfatizou que a articulação de saberes em saúde é fundamental para a atenção diferenciada aos povos indígenas. Portanto, “o trabalho de saúde, regido por protocolos do Ministério de Saúde, no contexto indígena, deve ser adequado ao sistema tradicional indígena de saúde.”

Sobre a questão das amputações realizadas sem levar em consideração a vontade da família do paciente, a Sesai afirmou que esses procedimentos ocorrem em ambiente hospitalar, fora dos domínios da atenção primária da saúde indígena prestada pela SESAI.

Dessa forma, o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS) são corresponsáveis pela atenção à saúde dos povos indígenas. A assessoria também garantiu que a SESAI está apurando junto ao DSEI se os procedimentos adotados estão de acordo com as diretrizes de respeito à cultura e às tradições indígenas.

A reportagem do Nós, mulheres da periferia trouxe o relato de Silas e sua mãe sobre o impacto da amputação sofrida pelo garoto, que aguardou oito horas para receber o soro antiofídico após ser picado por uma Surucu Pico de Jaca. Ambos relatam um forte impacto físico e psicológico decorrente desse incidente.

Em resposta, a Sesai informou que realiza ações de acolhimento e assistência psicossocial aos indígenas em situação de sofrimento psíquico. Essas ações incluem acompanhamento individual, familiar/comunitário em rodas de conversa, grupos temáticos, oficinas, estratégias de atenção psicossocial e atividades participativas de educação em saúde envolvendo os diversos atores das comunidades indígenas.

Em outra matéria da série, o professor e pesquisador de veneno há 20 anos na Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein, Thomaz Rocha e Silva, afirmou que a melhor solução para evitar as amputações de crianças indígenas vítimas de acidentes ofídicos é oferecer o soro mais próximo dessas comunidades, em qualquer unidade de saúde, independentemente de ser indígena.

Questionamos a assessoria de imprensa da Sesai sobre as perspectivas de garantir que esse soro esteja mais acessível para essa população, reduzindo o tempo de espera pelo atendimento para, no mínimo, duas horas, conforme sinalizado pela Fiocruz. Até o fechamento desta coluna, o órgão não havia fornecido uma resposta sobre o assunto.

Adriana Amâncio Jornalista formada pela Universidade Joaquim Nabuco (PE) com 25 anos de experiência em assessoria de comunicação e reportagem nas áreas de direitos humanos, gênero e meio ambiente. É repórter de Inclusão e Diversidade no Colabora – jornalismo sustentável. Já recebeu o Prêmio Sassá de Direitos Humanos, além de ser premiada por As Amazonas, Abraji e pela Embaixada dos Estados Unidos com o podcast “Cidadãs das Águas”.

Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

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