Primeira ida ao ginecologista

Eu tinha 14 anos e nunca tinha ido ao ginecologista e também não tinha um plano de saúde. Minha mãe sempre trabalhou muito e eu tinha pouco contato com ela. Só a via a noite quando chegava cansada e reclamando. Eu, nessa idade, era orientada pelas minhas tias sobre relações sexuais e métodos contraceptivos, já que com […]

Por Priscila Gomes

22|10|2014

Alterado em 22|10|2014

Eu tinha 14 anos e nunca tinha ido ao ginecologista e também não tinha um plano de saúde. Minha mãe sempre trabalhou muito e eu tinha pouco contato com ela. Só a via a noite quando chegava cansada e reclamando. Eu, nessa idade, era orientada pelas minhas tias sobre relações sexuais e métodos contraceptivos, já que com minha mãe, sem chance.
Comecei a namorar e minhas tias sempre me colocaram muito medo com relação a gravidez e doenças sexualmente transmissíveis. Mas também, por causa do trabalho, nenhuma delas podia me levar ao médico. O negócio mesmo  era “botar pânico”. Eu tomei coragem e aos 14 anos fui marcar uma consulta em posto de saúde da rede pública.
Tive que ir com meu namorado, na época, que tinha 20 anos. A recepcionista daquele posto me tratou de forma tão ríspida que fiquei imaginando como seria passar com o médico:
– Oi, por favor, quero marcar uma consulta com o ginecologista?
Em voz bem alta e, parece que de propósito, me perguntou:
– Já transa? Tá grávida?
Eu, morrendo de vergonha, disse que eu preferia falar com o médico. Ela riu e marcou a tal consulta pra uns cinco meses depois.
Chegando o tão esperado dia, fui com meu namorado, pois fui orientada por ela que tinha que ir acompanhada por alguém “de maió”. Rezei muito pra não estar menstruada, pois se estivesse  teria que remarcar novamente.
Entrei na sala e o médico tinha mais ou menos uns 42 anos, era calvo e usava óculos. Ele nem olhou na minha cara e perguntou o que estava acontecendo. Eu disse que era minha primeira consulta. Ele, ainda sem olhar e só anotando, perguntou se eu estava grávida. Eu respondi que não e estava lá para uma consulta de rotina. Mandou tirar a roupa e ir para trás da biombo.Fui.
Em nenhum momento perguntou se eu era virgem e foi logo fazendo o exame Papanicolau. Achei estranho, mas estava feliz, pois afinal eu estava na minha primeira consulta. Estava cuidando da minha saúde. Quando terminou o exame voltei para a mesa dele e sentei novamente. Ele tirou do bolso uma cartela de anticoncepcional e disse para tomar. Falou alto uma coisa muito séria:
– Você toma, parou a menstruação tem que descer. Se não descer você vem aqui e a gente já começa o pré-natal. Ah essa pílula é barata, custa R$2,30 e o posto também dá. No posto você também pode pegar camisinha. Tchau!
Fiquei surpresa e, na época, achei que tinha sido muito bem tratada, pois o médico até me deu uma cartela de remédios, olha só! Saí de lá e fui constatar se era verdade que o posto dava camisinha mesmo. No dia que fui não tinha.
Dias depois fui em outro posto e a atendente me deu cinco preservativos. Eu disse:
– Só cinco!
A atendente, bem nervosa e achando um desaforo me disse:
– Além de dar você tá achando pouco? Vai comprar!
– Mas eu não trabalho ainda, só faço bicos. Mas quero me prevenir.
– Só tem essas, se quiser!
Eu morrendo de vergonha, pois ainda era muito inocente, saí de lá querendo arrumar um buraco pra colocar minha cabeça dentro e as camisinhas junto. Nunca mais voltei nesse posto para pegar preservativos. Voltei pra pegar anticoncepcional, mas também era muito raro ter. Desse dia em diante, entendi porque a saúde pública é uma vergonha, é falida.
Passei a comprar meu anticoncepcional, já que custava somente R$2,30 e as camisinhas também. Eu me prevenia mais do que ninguém. Já que muitas pessoas faziam questão de falar que eu iria ser a próxima a engravidar. E eu fiquei por anos ouvindo essa frase:
– Nossa, você tem cara que vai encher a casa de filhos! A sua mãe nem tem tempo de cuidar de você.
Hoje estou com 31 e ainda não tive filhos. Ah e continuo me cuidando.