Oficinas de grafismos africanos e indígenas acontecem em novembro
Os encontros serão conduzidos por arte-educadores indígenas das etnias Kaimbe e Karajá e também professores da República Democrática do Congo
Por Jéssica Moreira
13|11|2020
Alterado em 13|11|2020
A Coletiva Tear & Poesia de Arte Têxtil Preta Nativa realiza no dia 18 de novembro as Oficinas de Grafismos Indígenas e Africanos, dando continuidade às atividades do Projeto Pangeia Entre Elos: Palavra de Mulher. Por conta da pandemia de Covid-19, as aulas serão gravadas e disponibilizadas gratuitamente no canal do Youtube da coletiva. Não é preciso realizar nenhum tipo de inscrição.
Os vídeos de ambas as aulas estarão disponíveis no dia 18/11, quarta-feira, às 19h. A aula de grafismo indígena será ministrada por Kuanadiki Karaka, da etnia Karajá, e também por Antony Ribeiro dos Santos, da etnia Kaimbé. Já a oficina africana conta com a participação do professor Duchelier Mahonza Kinkani, da República Democrática do Congo.
A importância dos grafismos
Para quem não conhece, os grafismos são as formas de representação geométrica de um determinado povo, que podem representar tanto a natureza quanto a cultura de determinados povos. Alguns povos tradicionais do continente africano, ou os mais de 300 povos indígenas originários do Brasil, são exemplos de sociedades que utilizaram essas sofisticadas representações artísticas para se comunicar e guardar suas memórias.
Os grafismos não são iguais, cada povo tem o seu, trazendo os mais diferentes significados, cores e traços, mostrando inclusive a diversidade dos povos indígenas que compõem o Brasil, por exemplo. “Os grafismos não servem apenas para serem vislumbrados, tatuados no corpo ou desenhados nas paredes das cidades. Por trás dos grafismos indígenas há a história de luta e resistência de um povo”, afirma uma das palestrantes, Kuanadiki.
Grafismos exemplificam diversidade dos povos indígenas
©Divulgação/Coletivo Tear
Representação dos valores e crenças
Nascida na cidade de São Felix do Araguaia, Kuanadiki pertence à etnia Karajá, da Ilha do Bananal (TO). É especialista na feitura de bonecas de cerâmica Karajá Iny e militante da saúde indígena. Para ela os grafismos também têm como objetivo mostrar a identidade cultural de cada povo, por meio de cores, traços e significados diferentes.
“O grafismo Karajá (Iny) representa nossa força e união. Representa também os valores e crenças tradicionais e culturais dos karajá (Iny)”, explica Kuanadiki, que acredita que as oficinas possam ajudar as pessoas a respeitarem os traços indígenas. “Elas precisam saber que significado isso tem para o nosso povo, reconhecendo que cada um tem seus grafismos. Reconhecer nossa diversidade fortalece nossas identidades”.
Grafismo como expressão
De Euclides da Cunha (BA) e da etnia Kaimbé, Antony migrou para São Paulo com a família quando ainda tinha 8 anos de idade. Hoje, aos 20, realiza oficinas sobre a cultura de seu povo e também estuda Administração. Para ele, ao entender os grafismos as pessoas também podem compreender melhor a individualidade de cada etnia.
“Para os Kaimbé as pinturas são uma ferramenta de comunicação e expressão. Temos pinturas para festejar, para guerrear e os desenhos mostram nossa caça, alimentos, materiais que usamos nas nossas vestimentas e outros pontos importantes da nossa aldeia”, aponta Antony.
Refugiado no Brasil há mais de cinco anos, Duchelier Kunkani é formado em Artes Plásticas na Academia de Belas Artes de Kinshasha, na República do Congo, já atuou como pintor e grafiteiro e também teve experiência em campanhas de publicidade. “Procuro sempre compartilhar minha experiência artística e cultural com todos e todas, pois acredito no potencial da arte como forma de comunicação e libertação de emoções e sentimentos”.
Da República do Congo, Kunkani apresenta cultura africana por meio da arte.
©Divulgação/Coletivo Tear
Segundo Rita Maria, coordenadora da coletiva Tear & Poesia, o intuito com as oficinas é dar uma base cultural às pesquisas que a organização realiza em 2020 sobre as similaridades entre as culturas que influenciaram na identidade brasileira.
“Temos como foco dialogar com a mulher em diáspora, tanto imigrantes africanas quanto latino-americanas e caribenhas, mostrando também semelhanças entre grafismos nativos brasileiros, indígenas, e africanos, buscando identificar similitudes sutis pouco estudadas e menos difundidas entre culturas originárias daqui e de África”, diz Rita.
Até o fim do ano a coletiva pretende também lançar um livro em bordado e textos, trazendo a pesquisa da ancestralidade africana e indígena e como se relacionam às vivências das mulheres nas periferias e valorização das identidades negras e indígenas.
Sobre a coletiva Tear e Poesia
A Coletiva Tear & Poesia de Arte Têxtil Preta Nativa é constituída por mulheres residentes da periferia da zona sul da cidade de São Paulo, que atuam há mais de 20 anos na região, com uma trajetória de participações em eventos, saraus, espaços e atividades. Bordam em estilo ancestral como forma de luta por igualdade de oportunidades e direitos, e valorização da beleza e identidades de negras e indígenas. Se autodenominam “tecelãs do verso”, pois bordam poemas e histórias ligadas à memória afetiva e herança cultural feminina, com questões ligadas às mulheres negras e indígenas, as crianças, a natureza, a culturas populares, tendo cantos, danças tradicionais e brincadeiras da cultura popular como estimuladores em suas oficinas.
O projeto “Pangeia Entre Elos – Palavra de Mulher” foi criado a partir de um processo de pesquisa sobre cultura, idioma e grafismos dos povos indígenas e africanos, com o objetivo de perceber na identidade brasileira as raízes profundas dessas tradições. Por meio da arte têxtil, a coletiva quer conectar mulheres bordadeiras com suas ancestralidades. O processo original de trabalho envolve encontros de bordados e a produção de um livro coletivo, mas diante do isolamento social em decorrência da pandemia do novo coronavírus, as oficinas estão sendo ministradas de maneira virtual. Saiba mais aqui: https://www.youtube.com/watch?