Na Boca do povo: CPI da Pandemia não tem mulheres nem pessoas negras
O objetivo da comissão é investigar a atuação do governo federal diante da crise sanitária. Um ponto de alerta é o fato da comissão titular ser composta por 11 senadores homens e brancos. Movimento de mulheres se manifestou
Por Redação
07|05|2021
Alterado em 07|05|2021
Sexta-feira é dia de Na Boca do Povo, uma curadoria dos acontecimentos mais importantes da semana no Brasil e no mundo. Aqui você acessa não só o fato, mas uma interpretação de como cada assunto impacta o seu dia a dia. Muita coisa acontece diariamente, e o Nós, mulheres da periferia te ajuda a focar no que realmente importa.
O que você precisa saber: Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde; Nelson Teich, também ex-ministro da saúde; e Marcelo Queiroga, o atual ministro, foram ouvidos na CPI da Pandemia (Comissão Parlamentar de Inquérito) nesta semana.
O objetivo da comissão é investigar a atuação do governo federal diante da crise sanitária, assim como os repasses para estados e municípios. Um ponto de alerta é o fato da comissão titular ser composta por 11 senadores homens e brancos.
Antes do começo da sessão na última terça-feira (4), a senadora Eliziane Gama (Cidadania – MA) fez uma intervenção solicitando que as mulheres tivessem a possibilidade de se inscrever para fazer perguntas ao primeiro depoente (Mandetta). Assim, as participantes não teriam que esperar os membros titulares (11) e os suplentes (7), todos homens, fazerem suas perguntas primeiro, como manda a regra, mas não foi consentido.
Em depoimento, Mandetta afirmou que “Bolsonaro tinha suas próprias ideias” e discordava das medidas do ex-ministro, que disse priorizar a ciência em todas as suas decisões.
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) terá um prazo inicial (prorrogável) de 90 dias para os procedimentos de investigação e, depois dessa etapa, deve elaborar um relatório final com análises e conclusões. O documento deverá ser encaminhado ao Ministério Público para eventuais criminalizações. Vale ressaltar que a comissão não tem o poder de julgar, mas sim de investigar.
Durante o depoimento, Teich afirmou que deixou o governo pelo fato do presidente insistir na cloroquina, medicamento que não tem comprovação cientifica contra a Covid-19.
Eduardo Pazuello, também ex-ministro da saúde, seria ouvido esta semana, mas, após alegar suspeita de Covid-19, seu depoimento acabou sendo remarcado para o dia 19 de maio.
Já Queiroga acabou por irritar os senadores por se esquivar e não responder as perguntas diretamente. Além disso, senadores que são aliados do governo dificultaram e tentaram evitar perguntas polêmicas para o governo.
Em que contexto isso acontece: Na segunda-feira, 3 de maio, antes de Mandetta ser interrogado, um grupo de mulheres fez uma reivindicação à CPI. O Levante Das Mulheres Brasileiras, movimento criado em maio de 2020, mandou uma carta para a CPI destacando que, como todos os integrantes são homens e brancos, o resultado “corre o risco” de não será representativo às mulheres, principalmente, às mulheres negras.
Um trecho da carta chama a atenção para a necessidade de que “esta CPI aborde as desigualdades estruturais que foram aprofundadas pela pandemia, considerando em especial os recortes de gênero e raça”. O texto diz ainda que a Covid-19 afeta, desigualmente, os diferentes segmentos da população e que o Brasil vive um “apartheid sanitário”.
A reunião acontece no formato semipresencial por decisão do presidente do Senado Federal
©Jefferson Rudy/Agência Senado
Desde os primeiros depoimentos que aconteceram, uma linha tem se destacado como fundamental a ser analisada na CPI: a possibilidade de o governo Bolsonaro ter utilizado como estratégia o conceito de “imunidade de rebanho”, rechaçada por especialistas, que prega o maior número de contaminação para evitar o aumento de casos.
Sobre isso, Mandetta disse que “não pode afirmar”, mas que “teve a impressão” de que isso aconteceu. Ele contou que havia um entendimento de que “as pessoas vão contrair isso porque moram em favelas, porque estão aglomeradas, porque não tem esgoto, porque o brasileiro vai se contaminar, que vai morrer só quem tem que morrer e que só está morrendo idosos. E embarcaram nessa teoria”.
Como isso atinge você: Enquanto a CPI prossegue, os números de mortes só aumentam. Desde o início da pandemia, o país já perdeu mais de 417 mil vidas. Cada vez mais, a causa principal desse cenário evidencia uma escolha política do governo federal.
A falta de pluralidade entre os membros da CPI não é representativa da população brasileira, que é composta por maioria de mulheres (51,8%) e por pessoas negras (56%). Isso faz com que as perguntas a serem feitas, assim como as questões a serem investigadas, não contemplarão c complexidade dos impactos da pandemia para toda a população.
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