muda de planta e mulher ao fundo

Mulheres lutam pela proteção da Mata Atlântica enquanto a legislação é flexibilizada

Na contramão da tentativa de facilitação do desmatamento da Mata Atlântica, conheça mulheres ativistas ambientais se dedicam a manter o bioma em pé

Por Beatriz de Oliveira

15|06|2023

Alterado em 16|06|2023

Enquanto políticos em Brasília, tentavam afrouxar a legislação de proteção da Mata Atlântica, mulheres presentes nos 17 estados que compõem o bioma lutam para proteger este solo que abriga a maior parte dos brasileiros, mas é também o mais desmatado. É o casos como o da ambientalista Miriam Prochnow, em Santa Catarina, da bióloga Liliana Souza, no Piauí, e da também bióloga Juliana Farinaci, em São Paulo.

Em todo o mundo, as mulheres protagonizam a luta contra as mudanças climáticas. De acordo com pesquisa de 2021 feita em 19 países, incluindo o Brasil, pelo Fórum de Mulheres para Economia e Sociedade (WFES). três em cada quatro mulheres mudaram seus hábitos para preservar o meio ambiente. Além disso, elas são as mais afetadas pelo aquecimento global, representando 80% dos deslocados por desastres e mudanças climáticas em todo planeta, conforme apontou o relatório apresentado durante a Conferência da ONU para Mudanças Climáticas (COP26), em 2021.

Era uma das definições previstas na Medida Provisória 1150/22, conhecida como a MP da Mata Atlântica, era permitir o desmatamento do bioma mais devastado do país sem estudo prévio ou medida de compensação. Na prática, o texto enfraquece as normas de proteção ao bioma ao alterar a Lei da Mata Atlântica. No dia 5 de junho, o presidente sancionou a medida com vetos.

A Mata Atlântica está em cerca de 15% do território nacional. Atualmente, restam apenas 24% da floresta original. O bioma é essencial para itens como abastecimento de água, regulação do clima, agricultura, pesca, energia elétrica e turismo.

Sendo assim, apenas a finalidade original da da medida provisória foi sancionada: ampliação em 180 do prazo para que proprietários rurais peçam adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) e vinculação dessa adesão à convocação pelo órgão ambiental. O programa tem como objetivo a restauração ambiental. Agora, a MP volta ao Congresso Nacional, que deve analisar os vetos e tem a possibilidade de derrubá-los.

Foram vetados os trechos da MP da Mata Atlântica, os trechos que definiam:

Desmatamento sem estudo prévio ou compensação em áreas para implantação de linhas de transmissão de energia elétrica, de gasoduto ou de sistemas de abastecimento público de água;

Fim da obrigatoriedade de captura, coleta e transporte de animais silvestres para realizar obras, exigindo apenas que eles sejam afugentados;

Permissão para que vegetação secundária em estágio médio de regeneração seja derrubada para fins de utilidade pública mesmo quando houver alternativa técnica ou de outro local para o empreendimento.

Conheça três mulheres que entendem a importância do bioma Mata Atlântica e lutam para mantê-lo vivo.

Miriam Prochnow: defensora da Mata Atlântica em Santa Catarina

mulher de cabelos brancos

Miriam Prochnow é uma ambientalista, educadora e ativista climática

©reprodução Instagram

Miriam Prochnow é uma ambientalista, educadora e ativista climática com uma longa trajetória em defesa da Mata Atlântica. É cofundadora da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi), organização localizada em Atalanta (SC) que atua na mobilização por políticas públicas em prol do bioma e na restauração de áreas degradadas. Ao longo dos 26 anos de existência da Apremavi mais de 8,5 milhões de árvores nativas foram plantadas.

Desde criança, Miriam tinha o ímpeto de cuidar do meio ambiente, chegou a fazer um protesto dentro de casa por ser contra a caça de animais, recusando-se a comer não comia as carnes que seu pai trazia ao caçar. Essa atitude levou seu pai a abandonar a atividade.

“Eu passei muito tempo da minha infância andando de canoa no rio [com meu pai], tendo esse contato direto. Minha mãe tinha um jardim muito bonito, cheio de flores, e me ensinou a apreciar também esse tipo de beleza”, afirma.

Miriam acompanhou toda a tramitação da Lei da Mata Atlântica, que durou 14 anos até ser sancionada em 2006 atuando ativamente na Apremavi. Ela também tem na memória, os sucessivos ataques à legislação que se seguiram ao longo dos anos, inclusive o último deles, visto com a MP da Mata Atlântica. Segundo a ambientalista os lobbies mais fortes contra a lei estão o setor imobiliário e o madeireiro.

Entre as várias situações marcantes da trajetória da ativista ambiental, destaca-se: o dia em que ela representou as Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam em prol do bioma durante a sanção da Lei da Mata Atlântica em 2006. Naquele ano de 2006, o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra do Meio Ambiente era Marina Silva, assim como hoje.

“A Mata Atlântica está em festa com a sanção dessa lei, senhor presidente. Está em festa porque significa que as florestas com araucária tem lei, que as estacionais residuais tem lei, que os brejos de altitude tem lei, que os encraves florestais do nordeste tem lei”, discursou Miriam Prochnow na ocasião, quase duas décadas mais jovem e ainda sem cabelos brancos.

Liliana Souza: conservação ambiental e luta social no Piauí

mulher de óculos e boné

Liliana Souza é bióloga e presidente da ONG Comissão Ilha Ativa (CIA)

©arquivo pessoal

Liliana Souza é bióloga e presidente da ONG Comissão Ilha Ativa (CIA), localizada em Ilha Grande (PI). A organização atua na Área de Proteção Ambiental (APA) Delta do Parnaíba que abrange os estados do Piauí, Maranhão e Ceará, e abriga comunidades tradicionais. Entre as atividades promovidas pela comissão, estão formações nas áreas de geração de trabalho e renda, conservação e preservação ambiental, educação ambiental. Criada por pescadores da região, a ONG ganhou adesão de pesquisadores ambientais.

Durante a graduação, Liliana tinha vontade de trabalhar com conservação marinha e espécies ameaçadas de extinção. Com o passar dos anos percebeu que nãoé possíveidissociar a luta por ambiental com a luta social. Entendeu que as comunidades tradicionais que vivem no bioma são parte fundamental de sua preservação.

Para Liliana, a MP da Mata Atlântica e outros desmontes de políticas ambientais são ações desumanas e impactam em maior grau as comunidades à preservação do meio ambiente.

“Nós sabemos quem são essas pessoas que protegem e preservam a Mata Atlântica. Esses povos têm seus territórios invadidos e a gente vive nessa luta de mostrar o quanto isso é importante, fica até repetitivo”, diz.

Juliana Farinaci: restauração ecológica em São Paulo

mulher de cabelos grisalhos

Juliana Farinaci faz parte da organização Akarui

©arquivo pessoal

Em São Luiz do Paraitinga (SP), a bióloga Juliana Farinaci faz parte da organização Akarui, que executa projetos de restauração ecológica, educação ambiental e valorização da cultura local.

A preocupação com a pauta ambiental a acompanha desde a faculdade de Biologia. Ela desenvolveu pesquisas acadêmicas, sobre a vegetação nativa do estado de São Paulo e se interessou em atuar em organizações voltadas para a restauração desse bioma tão devastado.

Com expressão de cansaço, Juliana comenta sobre o absurdo da necessidade de ainda hoje organizações e ativistas terem que defender que a Mata Atlântica deve ser preservada.

“É inacreditável que a gente ainda precise lutar nessas trincheiras. Um bioma tão detonado desde os primeiros exploradores dessa terra. Foi o primeiro bioma a ser saqueado, explorado. É incrível que com tão pouco restando ainda temos explicar porque é preciso é proteger. A gente deveria estar falando muito mais em recuperar o bioma, e não em criar novas formas de depredar”, afirma.