Israel e Hamas: origens do ataque são resposta a anos de violência contra Palestina
Sâmia Teixeira, jornalista e pesquisadora sobre a Palestina elucida as origens do conflito e expõe a realidade vivida pelos povos palestinos.
Por Mariana Oliveira
16|10|2023
Alterado em 16|10|2023
Por: Mariana Oliveira e Jéssica Moreira
Desde o sábado, sete de outubro, o Hamas, movimento de resistência palestino lançou um ataque surpresa e sem precedentes a Israel. O bombardeio deixou centenas de mortos e feridos, o grupo também sequestrou civis como reféns. Ao reivindicar os ataques, o Hamas afirmou se tratar de uma ofensiva para a retomada de território.
Apesar do estopim no fim de semana, em entrevista, a jornalista e pesquisadora sobre a Palestina, Sâmia Teixeira, explica que as origens do conflito entre Israel e Palestina precedem o combate atual, expõe a realidade dos palestinos e similaridades com o Brasil.
Nós, mulheres da periferia: Qual o fundamento do ataque do Hamas à Israel?
Sâmia Teixeira: O ataque do Hamas foi uma resposta inevitável de um longo processo de escalada de violência, isolamento, humilhação e agressão cotidiana dos povos palestinos que vivem sob um regime de apartheid discriminatório.
Nós: Pode explicar melhor o que é o Hamas?
Sâmia: O Hamas, é uma organização política e o único instrumento militar do Estado da Palestina, que não possui exército ou aparato militar que dê conta de enfrentar uma das maiores e mais bem equipadas potências militares do mundo. O grupo não é uma organização com uma representatividade expressiva, portanto não é correto afirmar que o Hamas é um sinônimo de povo palestino. Da mesma maneira, não é correto julgar ou denominá-lo apenas como terroristas.
Nós: A disputa que estamos acompanhando é atual? Qual a realidade da população palestina?
Sâmia: O povo palestino sofre por longos anos um sistema de apartheid e de discriminação, com leis exclusivas. É uma população extremamente jovem e totalmente abandonada, cercada militarmente, sem direito à mobilidade, dependentes do recebimento de doações da Organizações das Nações Unidas (ONU), sem acesso à água potável ou a serviços básicos de saúde. Além do mais, o povo palestino pode ser detido sem ter uma acusação formal, nas chamadas “prisões administrativas”.
Percebemos Israel cada vez mais fortalecido na região, ganhando o apoio de grandes potências mundiais e enriquecendo o setor militar importando e exportando armamento.
Vale ressaltar que Israel, nos últimos anos, tem atacado constantemente territórios palestinos, não somente Gaza, e violado importantes direitos humanos, no entanto a imprensa e a comunidade internacional, nunca denominaram tais ataques como terroristas.
Nós: Quem são as pessoas mais afetadas nesta guerra?
Sâmia: Toda essa situação impacta duramente a vida de mulheres e crianças palestinas. Dados do Centro Palestino de Estudos (PUC/SP) mostram que em 2022, as autoridades israelenses prenderam sete mil palestinos, pelo menos 164 eram mulheres e 865 eram crianças. São dados alarmantes que dizem respeito a esse sistema autoritário e discriminatório israelense. Outro dado da Defense for Children, diz que uma média de 500 a 700 crianças passam por cortes militares israelenses sem direito a um julgamento justo.
Nós: Em uma entrevista ao Nós, após um bombardeio na Faixa de Gaza em 2021, você afirmou que “A periferia é nossa Faixa de Gaza“. Como o conflito está relacionado com a violência brasileira?
Sâmia: Enquanto Israel mata os povos palestinos, aqui no Brasil quem morre é a população preta, pobre e periférica. Por isso acho importante saber dessas relações e compreender essas realidades para que possamos fortalecer nossas percepções de mundo, nossas lutas e maneiras de resistência. Durante o Governo de Jair Bolsonaro, o ex-presidente sempre utilizou do discurso extremamente violento, policialesco e alinhado à política israelense de violência sistemática e de limpeza étnica na Palestina. Nos últimos anos, o Brasil também tem colaborado com Israel, participando das chamadas “feiras da morte”, eventos de tecnologia militar que vende e expõe material bélico.
Conteúdo publicado originalmente no Expresso na Perifa – Estadão