Eu, mulher branca. O que o racismo tem a ver comigo?

Eu sou uma mulher branca. Mesmo vindo da periferia, demorei para entender que, apesar de ser pobre, a cor da minha pele me trazia privilégios em comparação às pessoas negras.

Por Bianca Pedrina

27|01|2022

Alterado em 27|01|2022

Cara gente branca: vamos falar sobre racismo? Eu sou uma mulher branca. Mesmo vindo da periferia, demorei para entender que, apesar de ser pobre, a cor da minha pele me trazia privilégios em comparação às pessoas negras, maioria do meu convívio.

Você já ouviu falar de branquitude? Um termo recente, que também integra o racismo, aponta para uma construção social de pessoas brancas se sentirem superiores em comparação às negras. A partir dos nossos privilégios, por não termos sido escravizados, a sociedade reproduz essa desigualdade, consciente ou inconscientemente (cada um avalia qual parte integra, só não diga que não é sobre você, porque é).

Se essa reprodução é feita por pessoas brancas, é mais do que urgente discutir o tema, nos lugares que ocupamos, para combater. E esse debate é meu. Esse espaço é ocupado por mim, branca, então cabe a mim questioná-lo e desocupá-lo.

Como minimizar o abismo causado pelo racismo sem nos questionarmos nesse espaço poderoso que é ser uma pessoa branca em um país racista?

Em tempos em que ainda se discute racismo reverso, temos que ampliar o debate. E isso parte de nos reconhecermos racistas

Se eu, branca, fico incomodada quando uma pessoa negra aponta que tenho mais direitos por ter a pele clara; se minimizo quando negras e negros sofrem racismo porque não foi cometido por mim; se não olho ao redor dos espaços que ocupo (trabalho e universidade, entre outros) para ver se há negros, o que fazem, que lugar ocupam; se faço a linha do “eu não cometo racismo, faço a minha parte’; se eu, pessoa branca, cego diante da estrutura racista criada também por mim, eu perpetuo essa lógica racista. Silenciar diante da estrutura racista perpetua a lógica racista.

Já ouvi muito discurso de gente branca igual a mim, da periferia, questionando cotas raciais e defendendo as sociais. No entanto, há camadas que perpassam a cor da nossa pele e nos levam a, mesmo sendo pobres, acessar mais direitos do que pessoas negras.

Uma pesquisa recente feita em Minas Gerais pela Fundação João Pinheiro e o Ministério Público estadual aponta que negros tem quatro vezes mais chance de sofrer violência policial do que brancos nas abordagens policias

Se você é um homem negro correndo na rua atrás do ônibus que acabou de perder, a probabilidade da polícia te ver como suspeito é maior do que se for um homem pobre branco na mesma situação.

Levantamento feito em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostra que menos de 30% dos cargos de liderança são ocupados por pessoas negras. Entre as mulheres, as brancas correspondiam a 66,9% dos cargos gerenciais e a parcela de negras nessas posições era 31%.

Nas 500 maiores empresas do país, segundo o Instituto Ethos, as mulheres negras representam 9,3% dos quadros e estão presentes apenas em 0,4% das chefias. Os negros são a maioria, 56%, da população brasileira. Mas ainda estão na base da pirâmide de direitos.

Apontamentos como esses questionam meu espaço de privilégio no mundo. Se eu, branca, em vez de refletir, atribuir a eles o conceito de racismo reverso, significa que quero continuar no poder. Afinal, “se estão tirando um espaço que é meu, estão me atacando”. O ponto é: para mim, pessoas negras devem ter direito ao mesmo espaço que eu. Só assim o lugar que ocupo não será mais considerado privilégio.

Por fim, sugiro fazer o teste do pescoço: olhe ao seu redor (trabalho, universidade, cinema…). Há pessoas negras? Quantas? O que estão fazendo? Qual é o espaço delas comparado ao seu? Indico também este episódio sobre branquitude do podcast Conversa de Portão , do Nós Mulheres da Periferia, e este outro do Expresso na Perifa que trata de política de cotas. Vale a pena conferir.

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Reportagem publicada originalmente no portal Expresso Na Perifa – Estadão.