COP26: ativista diz que mudanças climáticas afetam mais pessoas negras
Integrante da Coalizão Negra por Direitos que cumpre agenda de debates do clima na Europa comenta sobre a atuação do Brasil na COP26 e chama atenção para o racismo ambiental
Por Beatriz de Oliveira
09|11|2021
Alterado em 11|11|2021
Começou no dia 31 de outubro e segue até 12 de novembro a COP26 – sigla para Conferência entre as Partes. O evento acontece na cidade de Glasgow, na Escócia, e cerca de 25 mil pessoas de 196 países devem comparecer a fim de discutir soluções para a crise climática.
Em paralelo a conferência, a integrante da Coalizão Negra Por Direitos Thaís Santos participa de marchas e debates públicos na Europa. Cumprindo a agenda da organização nas mobilizações pelo clima, ela deve passar pelas cidades de Paris, Madri, Munique e Berlim. “É necessário nos organizarmos mundialmente para evidenciar que sem justiça racial não haverá justiça climática”, afirma.
Para a química e doutoranda em Bioenergia, as populações mais vulneráveis à crise climática devem protagonizar o debate. É o caso das pessoas negras, que “em escandalosa maioria são as mais afetadas pelas mudanças climáticas”. Por meio da divulgação de uma carta, a Coalizão Negra por Direitos denuncia que o debate do racismo ambiental não encontra ampla adesão em movimentos ambientalistas no país.
“Como resultado, temos a falta de segurança ambiental aos territórios urbanos e rurais de maioria populacional negra, impactada pela expropriação, poluição hídrica, atmosférica, pelos eventos climáticos extremos, pela morada em áreas de risco, pelo despejo de resíduos (…)” diz o texto.
Entre os destaques da COP26, está o Compromisso Global do Metano. O Brasil assinou junto a 102 países a meta de cortar 30% das emissões de metano até 2030. Outro acordo que o país aderiu foi o de zerar o desmatamento até 2030, plano que prevê destinação de US$ 19,2 bilhões para ações de preservação da floresta.
Em relação a atuação do Brasil na COP26, Thaís diz que, “na contramão das soluções, vimos o governo brasileiro vergonhosamente anunciar sua pedalada climática, deslegitimar discursos e dados e relativizar a gravidade dos fatos”.
Thaís Santos é co-fundadora da Comunidade Cultural Quilombaque, organização que promove arte e cultura no bairro de Perus, zona noroeste de São Paulo. É também coordenadora de núcleo da Uneafro Brasil, integrante de projetos no Instituto de Referência Negra Peregum e conselheira deliberativa da WWF Brasil (World Wide Fund for Nature).
Confira a entrevista completa!
Nós, mulheres da periferia – Até aqui, acompanhando de longe, o que você está achando da COP26?
Thais Santos – Temos urgências climáticas que precisam do comprometimento dos países e de ações efetivas. Na contramão das soluções, vimos o governo brasileiro vergonhosamente anunciar sua pedalada climática, deslegitimar discursos e dados e relativizar a gravidade dos fatos.
Impossível não se indignar frente a tamanha irresponsabilidade. A Coalizão Negra por Direitos, composta por mais de 250 entidades do movimento negro brasileiro, vai à COP26 para denunciar o racismo ambiental instaurado e as violações de direitos humanitários em territórios quilombolas e periferias brasileiras.
Nós – Quais suas expectativas em relação às ações de advocacy, marchas e debates públicos que vai participar como integrante da Coalizão Negra por Direitos?
Thais Santos – Acho potente e necessária esta articulação do movimento negro. Que nossas denúncias tenham repercussão para mobilizar a sociedade civil para uma incidência massiva na promoção da centralidade e protagonismo nas pautas de clima e ambiente das populações que estão mais vulneráveis às mudanças climáticas.
E como citado na carta dos movimentos negros que compõe a Coalizão Negra por Direitos para o mundo na COP26: “É hora de dar um basta na preocupação com a perda dos lucros das corporações transnacionais.
As vidas não poderão ser medidas pelo crescimento econômico das mesmas economias que não agiram de forma humanitária para salvar as mais de 4 milhões de vidas com a pandemia de Covid-19. A maioria das mortes seriam evitáveis no Norte e no Sul Global, se não estivessem em extrema vulnerabilidade social e ambiental”.
Nós – Você acredita que a COP26 trará resultados positivos para o combate à crise climática?
Thais Santos – Não dá mais para adiar esse combate. As lideranças mundiais precisam assumir compromissos expressivos. As negligências cometidas por empresas e governos devem ser culpabilizadas, milhões de pessoas estão morrendo pela ausência ou ineficiência destas ações.
As pessoas negras, em escandalosa maioria, são as mais afetadas pelas mudanças climáticas. O racismo que estrutura nossa sociedade mata sistematicamente a população negra utilizando diversas estratégias que extrapolam a violência das polícias. Logo os resultados serão positivos quando COPs deixarem de fazer jardinagem e avançarem neste sentido.
Nós – Como é para você estar prestes a viajar pela Europa durante a COP26 para cumprir agenda de mobilizações pelo clima?
Thais Santos – Uma honra cumprir essa tarefa ao lado de meus companheiros de luta da Uneafro Brasil e CONAQ [Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas] para estabelecer conexões com negros e negras em diáspora para denunciar o racismo ambiental e as violações de direitos humanitários em territórios quilombolas e periferias brasileiras.
É necessário nos organizarmos mundialmente para evidenciar que sem justiça racial não haverá justiça climática. Farei o possível para que as expectativas depositadas em mim sejam alcançadas.