
Catadoras promovem sustentabilidade através de cooperativa de recicláveis em SP
A Cooperativa de Trabalho e Coleta do Parque Cocaia (Cooperpac) atua nas áreas de coleta seletiva, reciclagem e gestão de resíduos baseada na economia solidária
Por Beatriz de Oliveira
04|06|2025
Alterado em 04|06|2025
O que começou na laje de uma casa no Grajaú, zona sul de São Paulo, hoje tem um espaço próprio e mais de 15 anos de história. Trata-se da Cooperativa de Trabalho e Coleta do Parque Cocaia (Cooperpac), uma organização formada em sua maioria por mulheres periféricas e que atua nas áreas de coleta seletiva, reciclagem e gestão de resíduos baseada na economia solidária.
Segundo definição da Secretaria Nacional de Economia Popular e Solidária, a economia solidária é centrada na valorização da colaboração e do ser humano, e não do capital, visando relações mais justas e sustentáveis, tanto na área econômica, como na ambiental.
Atualmente, o empreendimento está localizado no Jardim Satélite, zona sul da cidade de São Paulo. As etapas de trabalho envolvem a coleta de resíduos em residências, mercados e empresas; seguida da triagem e separação dos materiais por lotes e, por fim, a venda.
Segundo o relatório Atlas do Plástico, de 2020, existem cerca de 800 mil catadoras e catadores em atividade no Brasil e ao menos 1.700 cooperativas e associações organizadas em torno dos recicláveis.
Além disso, de acordo com o Atlas da Reciclagem, em 2022 foram recuperados 647 mil toneladas de resíduos sólidos e injetados R$81 milhões a partir da comercialização de resíduos recicláveis por meio das cooperativas e associações de catadores.
Como se constrói uma cooperativa de catadores?
A história da Cooperpac começa em 2007, quando Valquíria Cândido e seu marido, Fernando Pereira da Silva foram incentivados a criar uma cooperativa de catadores após terem sido demitidos de uma empresa estatal de coleta de lixo. Eles reuniram 20 associados, formados por familiares e vizinhos, e iniciaram a coleta de porta em porta na região, usando a laje de casa como espaço de trabalho.

Valquíria Cândido é catadora e presidente da Cooperpac
©Beatriz de Oliveira
Esse início não foi nada simples, e os aprendizados vieram a partir de uma sequência de erros e acertos. Foi preciso um ano para conseguir registrar o CNPJ da cooperativa e atender todas as exigências legais. “A gente não sabia como funcionava uma cooperativa e nem tínhamos instruções de como formar uma cooperativa de catadores”, conta Valquíria, que tem 50 anos de idade, é mãe de 4 filhos, catadora e atual presidente da Cooperpac.
Cooperativas são sociedades de pessoas que se reúnem para prestar algum serviço específico, sem fins lucrativos. As decisões são tomadas em conjunto, por meio de assembleias. Para criar uma cooperativa, é necessário ter ao menos 20 pessoas associadas, um ato constitutivo e um estatuto.
O ano de 2010 abriu caminhos para a Cooperpac e para organizações de recicláveis de forma geral. Naquele ano, foi aprovada a Lei 12.305, que passou a delimitar a Política Nacional de Resíduos Sólidos e definiu que os municípios deveriam fazer a gestão integrada dos resíduos sólidos gerados em seus territórios.
Nesse contexto, também em 2010, a Cooperpac passou a ser apoiada pelo Fundo Especial de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (FEMA), da prefeitura da cidade de São Paulo. Isso permitiu que a cooperativa pudesse operar em um galpão apropriado, cujo aluguel é pago pela prefeitura. O apoio também possibilitou a compra de equipamentos de proteção e uma formação sobre cooperativismo.
As catadoras da Cooperpac
Atualmente, a Cooperpac é formada por 22 sócios, dos quais 16 são mulheres – e a maioria delas tem mais de 45 anos de idade. Entre elas está Helena Novais, que diz se sentir feliz trabalhando em um espaço que lhe possibilita levar sustento para a família e, ao mesmo tempo, contribuir para a preservação do meio ambiente.
“A gente ganha pouco, mas se sente em um trabalho alegre, todo mundo que trabalha aqui está contente por trabalhar na reciclagem”, afirma a catadora e tesoureira, que trabalha na organização há 14 anos.
A média salarial dos cooperados é de um salário mínimo. O valor é definido após o pagamento das despesas, custos operacionais e recolhimento do INSS, e o restante arrecadado é dividido por horas trabalhadas de cada cooperado.

Helena Novais é uma das catadoras da Cooperpac
©Beatriz de Oliveira
Já Margarida dos Santos trabalha na Cooperpac há um ano. “É a primeira vez que eu trabalho na reciclagem. Todo dia aprendo um pouco e é divertido”, conta. Ela passou a ter uma nova visão sobre os resíduos após a experiência na cooperativa. “Eu ando pela rua e vejo uma latinha, eu já quero pegar, não aguento ver as coisas no chão” relata.

Margarida dos Santos é uma das catadoras da Cooperpac
©Beatriz de Oliveira
Valquíria Cândido, por sua vez, conta que se desenvolveu muito desde que fundou a Cooperpac. “A cooperativa me ensinou que a gente não pode ficar só trabalhando, sem questionar as coisas, a gente tem que questionar”, diz ela, que atualmente estuda Ciências do Trabalho.
Ao participar do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), Valquíria passou a entender que esses profissionais fazem um serviço de utilidade pública e devem ser reconhecidos por isso. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em estudo de 2013, a categoria é responsável por aproximadamente 90% de tudo que é reciclado no Brasil. Além disso, de acordo com estimativas do MNCR, cerca de 70% da categoria é formada por mulheres.
GALERIA 1/7
Diante de sua história, Valquíria não se considera uma empreendedora, mas sim uma trabalhadora. “Considero aqui uma cooperativa de trabalhadores, porque tudo que a gente conseguiu foi na raça. Não teve um investimento. Não teve grana”, afirma.