Caso Alícia Valentina: menina morre após sofrer agressão de colegas em escola de PE

A menina de 11 anos foi vítima de espancamento na Escola Municipal Tia Zita, em Belém do São Francisco (PE)

Por Beatriz de Oliveira

11|09|2025

Alterado em 11|09|2025

Aos 11 anos de idade, a estudante Alícia Valentina faleceu após ser agredida por colegas na Escola Municipal Tia Zita, em Belém do São Francisco (PE). O caso de espancamento ocorreu no dia 3 de setembro, e a menina teve morte cerebral por traumatismo craniano confirmada no dia 7.

Alícia foi agredida por cinco colegas, quatro meninos e uma menina, no banheiro da escola. Segundo o boletim de ocorrência, feito pela tia da vítima, entre os supostos motivos que levaram à agressão está o fato da menina ter se negado a “ficar” com um colega. Como os agressores são menores de idade, seus nomes não foram divulgados em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O caso está sendo investigado pela Polícia Civil de Pernambuco e acompanhado pelo Ministério Público do estado. Segundo nota enviada ao jornal Folha de S. Paulo, a Promotoria está em fase preliminar das apurações. “No momento não podendo fornecer mais informações para não atrapalhar as investigações, bem como está sob sigilo por se tratar de criança”. 

No dia da agressão, funcionários levaram Alícia a um hospital municipal, após ter apresentado sangramento no nariz, onde foi atendida e liberada. Já em casa, seu ouvido começou a sangrar, e a família a levou ao posto de saúde, onde foi novamente atendida e liberada. Novamente em casa, a menina passou a vomitar sangue e foi levada ao Hospital Municipal Belém de São Francisco e transferida para o Hospital regional de Salgueiro, em uma cidade próxima. Já no dia seguinte, devido à gravidade da situação, foi transferida para o Hospital da Restauração, em Recife.

Em nota, a prefeitura de Belém do São Francisco disse que não houve omissão no atendimento de saúde da vítima. “Esclarecemos, ainda, que não houve negligência médica ou alta hospitalar pelos profissionais de saúde que realizaram o atendimento da menor Alícia Valentina no Hospital do município Dr José Alventino Lima. Salientando que a menor foi levada para casa, por sua mãe, sem autorização da médica plantonista”, aponta um trecho da nota. 

Em entrevista à TV Grande Rio, a mãe de Alícia, a agricultora Ana Vilka Lima, contestou a versão da prefeitura. “É mentira, a médica não mandou eu aguardar, nem as enfermeiras mandaram eu aguardar, de jeito nenhum. Aplicou a injeção, mandou pra casa”, disse. 

Já a Escola Municipal Tia Zita afirmou que tem prestado apoio e assistência à família da vítima. “Alícia sempre será lembrada com carinho pela sua alegria, simplicidade e convivência entre colegas, professores e funcionários”, pontua o texto. 

O velório de Alícia Valentina ocorreu nesta terça-feira (09). Em um momento, colegas da menina fizeram uma homenagem e uma oração. Além disso, na ocasião, a mãe da vítima cobrou justiça. “Eu perdi minha filha, ela não vai mais voltar. Eu só quero justiça. A morte dela não pode ficar assim. Ela era uma menina maravilhosa, todo mundo gostava dela. Eu não posso deixar ficar por isso mesmo”, disse, de acordo com matéria veiculada na Folha de S. Paulo. 

O ódio contra meninas e mulheres 

O caso de Alícia Valentina se insere em um contexto de números alarmantes relacionados à violência no ambiente escolar e crimes de ódio contra meninas e mulheres. Segundo o Boletim Técnico de Violência nas Escolas, produzido pelo Ministério dos Direitos Humanos e pelo Ministério da Educação, em 2023 o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 13.117 vítimas de violência interpessoal nas escolas brasileiras. A maior parte das vítimas era composta por meninas (60,6%), e metade dos casos notificados foi de violência física. 

O relatório apontou ainda que as principais causas de violência nas escolas envolvem o aumento do extremismo e sua disseminação por meios digitais; a falta de controle e criminalização de discursos e práticas de ódio; a promoção da cultura armamentista e a glorificação da violência; a prevalência de bullying, preconceitos e discriminações no ambiente escolar; e a insuficiente formação profissional para lidar com questões como mediação de conflitos.

A violência sofrida por Alícia, supostamente motivada pelo fato de a menina ter se recusado a “ficar” com um colega, também pode ser interpretada a partir da cultura de misoginia (ódio contra as mulheres) presente na sociedade. Entre 2017 e 2022, a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos da SaferNet recebeu 74,3 mil denúncias de misoginia no ambiente virtual no Brasil. Apenas em 2022, o número chegou a 28,6 mil denúncias, um aumento de quase 30 vezes em relação a 2017. 

Na reportagem “Incels e Redpills: o que são, onde vivem, do que se alimentam?”, do Nós, mulheres da periferia, explicamos que a internet amplifica o ódio propagado no cotidiano. “A forma como agimos no mundo físico influencia nosso comportamento on-line, e vice-versa. Ela se manifesta, por exemplo, no aumento de ataques por grupos conservadores em redes sociais, ataques a blogs e perfis pessoais, geralmente centrados em questões de raça, gênero, sexualidade e ofensa a outras minorias historicamente marginalizadas”, revela o texto assinado pela repórter Amanda Stabile.