BBB 23: a branquitude não está preparada para a excelência negra

Jornalista Lívia Lima analisa a eliminação de Domitila Barros, do BBB. "A branquitude não está preparada para lidar com a excelência negra".

20|04|2023

- Alterado em 20|04|2023

Por Mariana Oliveira

“O BBB23 acabou hoje!”. Essa foi uma das manifestações que muitas pessoas publicaram nas redes sociais depois da eliminação de Domitila Barros do Big Brother Brasil na última terça-feira. “Campeã moral”, foi outra das definições atribuídas à atriz, modelo – Miss Alemanha, além de empreendedora e ativista social.

Na edição com mais pessoas negras nos 23 anos de realização do reality show no Brasil, a final foi definida excluindo todos eles. Ricardo Alface, provavelmente, será o último eliminado nos próximos dias. A discussão aflorou o debate sobre racismo, que desde os últimos anos pautou muito as relações e polêmicas do programa.

Para além das análises sobre atitudes e comportamentos individuais dos participantes, que evidentemente tornam a final por si só equivocada (cansativo até descrever), é interessante notar como dentro da casa do reality, na percepção que os participantes brancos tinham dos negros, e também fora dela, como uma projeção do público nesses integrantes, havia uma dificuldade em compreender – e aceitar – as qualidades das pessoas negras.

Domitila foi, por muitas semanas, alvo das críticas e armações para ser a eliminada do programa. Cacheada, afrontosa, debochada, seus inimigos no programa não aceitavam que ela não estava lá “para servir”, como a pernambucana mesma enfatizou, e não aceitavam a forma como ela os respondia, em pé de igualdade, criticando os usos de sua “militância” para supostamente se beneficiar.

Como é rasa essa ideia de que a gente ganha alguma coisa com discurso e militância. A gente só o faz exaustivamente porque estamos perdendo o tempo todo, em tudo. O próprio programa é a prova disso.

O que as pessoas brancas na verdade acham difícil de lidar é com as verdades sendo ditas na cara delas pronunciadas por pessoas negras. O brasileiro até quer admitir que existe racismo, mas quer que isso seja revelado por estatísticas, por dados criados por intelectuais e pesquisadores brancos, onde gente preta seja só objeto de estudo. Quando Domitila expõe as feridas sociais que o racismo provoca, isso é considerado agressivo, desmedido.

Se agressividade fosse parâmetro, outras pessoas – que não vale a pena nem mencionar – não seriam consideradas para estar na final de um programa de TV que mobiliza a sociedade brasileira. Até porque se esse fosse o critério, tais pessoas não eliminariam Sarah Aline, participante preta, retinta, que demonstrou como resolver conflitos mantendo a postura, o diálogo, com classe, argumentação e retidão.

“Ela fala difícil”, foi uma das críticas às qualidades de Sarah. A branquitude não está preparada para lidar com a excelência negra. E isso acontece porque tais características evidenciam o quanto elas são beneficiadas pelo racismo estrutural (ou forma social escravista – como preferir), o quanto elas estão confortáveis sendo apenas medíocres.

Domitila além de miss (na Alemanha caucasiana!) fala mais de sete línguas e ainda é envolvida em questões sociais. Sarah, com apenas 25 anos, é consultora de diversidade, além de já ter atuado em ações em casas de detenção para menores infratores. E o que pessoas brancas estão fazendo enquanto isso?

Como a sociedade sempre exige mais de nós, mulheres pretas, não tem como não entregarmos o nosso melhor, não tem como não sermos excelentes. E isso ainda incomoda muita gente quando estamos disputando os mesmos espaços e prêmios que eles.

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

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