Mulheres da periferia lançam loja de camiseta ecológica
A ideia partiu de duas jovens mulheres moradoras de periferias opostas de São Paulo
Por Redação
01|08|2016
Alterado em 01|08|2016
Trazendo artistas da periferia como destaque, no próximo dia 5 de agosto acontece o lançamento da loja virtual Síntese, que vai vender camisetas de algodão com fibra de garrafas pet recicladas.
A ideia partiu de duas jovens mulheres moradoras de periferias opostas de São Paulo. Foi em Moema, bairro nobre da zona sul de São Paulo, que a jornalista Izis Bispo, 30, da Jova Rural (Zona norte) conheceu a publicitária Karina Salazar, 24, do Capão Redondo (Zona sul).
Funcionando de forma One for One, para cada camiseta vendida, outra camiseta será doada para crianças de baixa renda, participantes de projetos sociais. “Eu sou da periferia e vi que é importante dar espaço para os artistas da periferia, para que eles pudessem mostrar sua arte. A pessoa que fez o desenho vai ter orgulho ao ver as pessoas vestindo a camiseta, e quem comprar vai ter orgulho daquele artista, daquela estampa, de ajudar outras pessoas”, aponta Izis.
Jornalista Izis Bispo, 30, da Jova Rural (zn) e a publicitária Karina Salazar, 24, do Capão Redondo (zs)
De acordo com os dados do Observatório Cidadão da Rede Nossa São Paulo em 2010, a subprefeitura de Vila Mariana, da qual o bairro de Moema faz parte concentrava 8,37% dos empregos da cidade de São Paulo. A subprefeitura do Campo Limpo, da qual o Capão Redondo faz parte tinha 1,58% e a subprefeitura de Jaçanã Tremembé, da qual a Jova Rural faz parte concentrava apenas 0,90% do total de empregos na capital.
Izis é bahiana, veio com os pais para São Paulo com seis anos de idade. Depois de alguns anos os pais se separaram. Na época de escolher uma faculdade, gostava de escrever, “queria uma coisa que pudesse ajudar as pessoas, ajudar a sociedade de alguma forma”. Entrou no curso de jornalismo no ano de 2004, mas por conta de dificuldades financeiras, mesmo com apoio da mãe manicure, ela só conseguiu concluir o curso em 2011. “Com um semestre do curso me apaixonei, não tinha mais dúvidas, só não tinha dinheiro”. Concluiu o TCC após o nascimento de sua filha, “foi difícil, mas só me ajudou a não desistir, minha filha merecia ter um exemplo positivo”.
O nome do novo empreendimento não é à toa, já que a iniciativa pretende sintetizar várias iniciativas positivas em uma só. “Pesquisando nomes, a gente queria uma palavra que fizesse sentido para a gente sobre o que a gente queria passar, da definição de síntese que seria juntar coisas diferentes que culminam em algo em comum. A nossa ideia é juntar arte independente, preocupação com o meio ambiente e juntar a doação em algo que faça sentido. A Síntese é isso a reunião de coisas diferentes em algo que possa fazer a diferença”, explica Izis.
Loja Virtual Síntese
O projeto nasceu em um curso de Make Thinking, que tinha como objetivo tirar projetos do papel em tempo recorde. Logo a ideia ganhou vida e foi premiada com mil reais do fundo Semente, ao ser o melhor projeto apresentado na primeira edição do curso.
“A gente ganhou e foi com esse dinheiro que a gente começou”, explica. As camisetas vão reunir, arte, ação social e ecologia. “Elas vão levar a arte das pessoas da periferia para o mundo, reverter isso para instituições doando essas camisetas para as crianças atendidas e reverter também para o meio ambiente”, diz.
Meses atrás Izis foi fazer um intercâmbio de dez dias em Madrid na Espanha, pela escola onde estuda espanhol. “Foi um rebuliço aqui em casa, ninguém nem tem passaporte aqui. Quando tirei ano passado, as pessoas diziam para que você vai tirar passaporte, fazer um documento a mais, caro e você não vai viajar. Eu disse ok, mas se um dia surgir a chance eu vou. Chegou uma promoção na escola. Normalmente uso meu décimo terceiro para fazer o aniversário da minha filha, que o aniversário dela é no fim do ano, só que nesse ano ela ia passar o aniversário com o pai dela, e ele ia ter os gastos com a festa. Posso pegar esse dinheiro. Economizo um pouquinho, e eu poderia fazer essa viagem. Ninguém na minha família nunca foi para fora do Brasil, eu posso fazer isso por mim e por todo mundo para as pessoas verem que vale a pena. Fui, foi uma experiência muito boa, eu gostei muito de lá, é muito diferente da realidade que a gente vive, mas o sentimento que eu voltei para casa não foi achando que o Brasil é horrível, que todo mundo tem que ir embora para a Europa. A questão não é essa. O que eu vejo é que dá para viver de uma forma diferente. E o que a gente faz, que a gente conheça o mundo, mas que a gente volte para casa para aplicar as coisas boas, foi com essa percepção que eu resolvi voltar, tem muita coisa boa sendo feita lá fora, quero trazer fazer isso e fazer aqui ”, relata.
O consumo é uma questão que varia na periferia, algumas pessoas tem a auto estima baixa, usam marcas porque querem se impor pelo ter. “O produto para eles é uma forma de se valorizar. Outra coisa que a gente quer mudar é a questão do consumo, as pessoas precisam entender melhor como consumir”.
“A gente quer montar um dia especial com essas crianças, a gente faz a doação das camisetas, a gente vai passar um vídeo, para eles entenderem que aquilo não é só uma camiseta, qual foi o processo, as pessoas compraram, sabiam que a gente ia doar para eles, como a camiseta foi feita a partir da pet, para eles terem a consciência quanto ao meio ambiente também. Montar um dia divertido com eles para marcar como algo especial. Para fazer tudo isso demanda tempo, e encontrar parceiros.
O inconformismo e a vontade mudar o mundo é o que movem Izis. “É isso que vai me diferenciar, é isso que vai me dar forças para continuar, é isso que vai me fazer ser uma mãe melhor para minha filha. É o não me conformar, porque tem muita gente conformada. Não são os conformados que vão fazer a diferença. O que muitas vezes me foi colocado como defeito e hoje vejo que é uma qualidade é não ser conformada”.
Os planos para o futuro é que as camisetas possam ser fabricadas por costureiras na periferia, e que o material também seja coletado nos bairros. “São coisas da periferia, para a gente tudo é mais difícil, mas também sei que existe um mundo lá fora, e existem outras possibilidades”, finaliza.
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