Do Capão Redondo para Dublin “Ela não me pagou e me abandonou no ponto à noite”, por Gisele Ferreira
Gisele Ferreira, 34, publicitária, saiu do Capão Redondo, zona sul de São Paulo, e morou em Dublin por quase um ano, onde foi au pair. Leia seu relato na íntegra. Leia aqui o especial: Da periferia de SP para a Irlanda: desafios das babás brasileiras em Dublin Todo brasileiro de qualquer classe social sabe sonhar. Mas […]
Por Redação
01|03|2016
Alterado em 01|03|2016
Gisele Ferreira, 34, publicitária, saiu do Capão Redondo, zona sul de São Paulo, e morou em Dublin por quase um ano, onde foi au pair. Leia seu relato na íntegra.
Leia aqui o especial: Da periferia de SP para a Irlanda: desafios das babás brasileiras em Dublin
Todo brasileiro de qualquer classe social sabe sonhar. Mas como é sonhar? Estou fazendo essa pergunta porque muitas vezes sonhamos demais e agimos de menos. Ou, talvez, sonhamos os sonhos dos outros ou sonhamos o que é cobrado pela sociedade. Tudo isso porque que não paramos para pensar como ou o quê queremos sonhar.
Vou contar como eu, Gisele, uma menina que nasceu na periferia conseguiu viver em outro país durante um ano, no caso, na Irlanda. Vou explicar porque estou falando sobre como sonhar. Na verdade, eu nunca tinha sonhado em fazer intercâmbio, até porque, como eu disse, cresci na periferia e quase nunca se ouvia falar em intercâmbio.
E como eu pensava que o “meu sonho” era o de casar, ter filhos e um bom trabalho. Que é o que a sociedade nos cobra. Nunca nem pensei que seria possível realizar um intercâmbio. No meu caso, descobri, antes de casar, que na verdade esse sonho não era verdadeiramente meu. Estava noiva e resolvi desistir de tudo. Percebi que ainda não tinha vivido tudo que gostaria antes de entrar nessa de casamento, filhos, etc.
Nessa época, eu também tinha um bom trabalho e também desisti dele. Foi aí que acreditei ser possível sonhar o meu sonho de viajar o mundo. E decidi que iria fazer meu intercâmbio. Um sonho que, como disse, não era meu antes. Mas como é que eu ia pegar todo meu dinheiro de anos de trabalho e investir em outro país? Todo mundo me criticou, claro. Todos diziam que eu tinha que dar entrada no meu apartamento. Até porque eu já estava com meus 30 anos de idade.
Minha família ficou de “boca aberta”, mas como você vai sozinha?, questionaram. Mas você nem sabe falar Inglês! E se… e se… Também tive meus medos. Mas é tão gostoso quando colocamos isso de lado e realmente enfrentamos tudo e todos. Como se fossemos super-heróis. Arrumei as malas e segui viagem. Muitas coisas aconteceram até eu chegar lá na Irlanda. Mas isso vocês vão ler no meu livro sobre o meu intercâmbio.
Cheguei à Irlanda em abril de 2014. Percebi logo, que realmente não sabia falar nada em inglês. E pensei “será mesmo que isso fazia parte do meu sonho? Medos. Mas com o tempo você encontra muitos brasileiros, faz muitos amigos e ama ir à escola estudar Inglês. É tudo novo, e o país ajuda porque é lindo!
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- Da periferia de SP para a Irlanda: desafios das babás brasileiras em Dublin
Vou dizer a real. Não foi fácil. Uma menina da periferia indo morar no exterior é motivo de risos para os nativos. Mas assim, fazemos quando ouvimos um estrangeiro falando ou tentando falar o português. Estudei, fiz amigos e procurei emprego. Não tive muita sorte. E, por isso, somente por isso não renovei mais um ano. Mas acredito que isso tudo também foi propósito de Deus em minha vida.
A experiência como au pair
A primeira entrevista de Au pair (Babá) foi engraçada. Foi com uma família indiana. A fama deles na Irlanda não é boa, dizem que eles não pagam direito e exploram muito. Também era muito longe de Dublin, onde eu morava. Mas fui porque precisava de experiências. A família fez eu comer a comida deles e, nossa, gostei das crianças, mas a casa era uma bagunça e ela (a mãe) disse que era médica e que fazia muitos plantões. Bom! Realmente eu ia ser explorada. Disse “não, obrigada!”
Fiz algumas entrevistas pelo Skype também. Tudo isso porque tinha que treinar meu inglês e saber as perguntas feitas nas entrevistas. E isso foi bom. Quando encontrei o primeiro trabalho ainda não entendia quase nada e tinha muita dificuldade em falar (ainda tenho…rs). Foi em uma casa grande, cheia de janelas. A casa que sonhava ter um dia. A mulher tinha 43 anos, era solteira e tinha uma filha de 3 anos. Na entrevista, ela já quis logo que eu treinasse no volante, mesmo estando de noite. Fiquei desesperada, pois lá se dirige do lado contrário ao nosso (via inglesa). Mas fui segura (só que não!). E consegui. Fui contratada.
Era somente uma menina, mas a menina era tão “terrível” que precisava de duas au pairs e ela ainda ia para a escola das 10h às 16h. Ela acordava de 3h em 3h e eu ou a outra au pair tínhamos que correr para fazer ela dormir novamente. Quando eu acordava, depois de tanto choro, me sentia sonolenta e derrubava copos e pratos, quebrei muitos por lá. Mas uma parte foi boa. Como somente eu dirigia, então acabava saindo bastante de casa e, às vezes, parava no caminho para falar com Deus e ficava olhando a natureza. A casa ficava em um bairro residencial, mas cada casa tinha a distância de 500m, mais ou menos, uma da outra. Quando eu tinha folgas voltava à noite e ia andando sem medo nenhum.
A saga continua, a menina chorava para trocar de roupa, tomar café, ir para escola, enfim, chorava, chorava e chorava. Mas aí ela começou a fazer natação e eu que a levava. Um dia, a mãe começou a ver que eu brincava com ela na piscina, então, pediu para eu ficar mais tempo com ela na piscina, para ela se cansar e ver se dormia melhor. Com isso, consegui fazer com que ela nadasse sozinha, pois ela tinha muito medo. A mãe ficou tão feliz que pediu para eu ficar por mais tempo trabalhando lá. Disse sim. Mas eu teria que trabalhar Natal e Ano Novo. Pensei melhor depois e disse que, na véspera do Natal, eu queria passar na casa do meu namorado. Expliquei que Natal é família para os brasileiros. Lá, eles nem comemoram a virada. Somente o almoço. Mas sabendo que a mulher era meio estourada, arrumei toda minha mala já com medo de ela dizer para eu ir e não voltar mais. E não deu outra. Quando ela foi me levar no ponto disse “Pega todas suas coisas e vá embora”!. Ela não me pagou e me abandonou no ponto à noite, com um monte de mala. Na Véspera de Natal. Chorei, claro.
Voltei para a casa que morava antes de encontrar esse emprego. E logo depois consegui um trabalho vendendo jornal no ponto do Luas, que é tipo um metrô que passa pela rua. Cheguei a pegar sensação de -11ºC em uma manhã. Trabalhava das 6h às 9h. Quase morri de frio. As pessoas tinham dó de mim. Mas mesmo assim não compravam, porque nem queriam tirar a luva da mão e pegar dinheiro. Fui demitida. Não vendi nada em 3 semanas (risos).
De volta à procura, logo consegui outra família para trabalhar como Au pair e essa nova família parecia a “Família Margarina” de tão perfeitinha. A mulher era madura, com 42 anos e tinha um filho de 2 anos e uma menina de 7 meses. A educação era perfeita. Eles moravam em Bray, uma cidade pequena perto de Dublin, onde havia praia. Ia passear com as crianças sempre. E essa sim foi uma linda experiência. Mas tive que voltar para o Brasil, pois não consegui juntar dinheiro para ficar mais. Chorei de novo. Porque amei essa família e as crianças. A gente se apega muito.
Com isso, aprendi como queria criar meus filhos e qual rotina quero ter em família. Foi muito bom para mim. Além de toda essa experiência, encontrei meu príncipe encantado na Irlanda. Onde fez com que eu realmente percebesse que esse era meu sonho verdadeiro. Conhecer meu namorado lá na Irlanda fez toda diferença de sonho e plano de Deus em minha vida.
Finalizando, digo que acreditem nos sonhos. Que sonhe os sonhos de vocês. Que parem às vezes, somente para pensar no sonho de vocês. Que acreditem neles e busquem saber qual sonho pode ser verdadeiro, qual sonho é realmente seu ou qual sonho Deus está te mostrando que é possível realizar. Can you believe? Você pode acreditar?
I Believe! Eu Acredito que os sonhos podem se realizar se você lutare e agir para realizar. Periferia? Sim, mas é na periferia que aprendemos a ser fortes e a lutar.
Este relato faz parte do especial “Da periferia de SP para a Irlanda: desafios das babás brasileiras em Dublin”