Foto mostra família de Ágatha segurando um cartaz com sua foto e o texto nós não te esqueceremos

5 vezes em que balas perdidas tiveram alvo, cor e endereço certo

Em um país onde a violência racial se entrelaça com as ações do Estado, a maioria das vítimas é composta por jovens negros, entre 18 e 29 anos

Por Amanda Stabile

24|04|2025

Alterado em 24|04|2025

A cada quatro horas, uma vida negra é tirada pela ação policial no Brasil, como revelado pela Rede de Observatórios da Segurança em seu boletim de 2022. Em um país onde a violência racial se entrelaça com as ações do Estado, a maioria das vítimas é composta por jovens negros, entre 18 e 29 anos.

Esses dados são ainda mais alarmantes quando observado o impacto dessa violência nas infâncias e adolescências negras. Em 2023, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a polícia foi responsável pela morte de 6.393 pessoas, sendo 71,7% crianças, adolescentes ou jovens de até 29 anos, e 82% dessas vítimas eram negras.

O relatório da Plataforma de Direitos Humanos Dhesca Brasil, lançado em agosto de 2024, foca na Bahia e no Rio de Janeiro, estados com altos índices de letalidade policial. O estudo revela que, em Salvador (BA) e região metropolitana, 47% das vítimas fatais de ações policiais eram negras e 94% eram meninos.

Diante desse cenário, movimentos sociais organizam atos em resistência. Um exemplo é o Ato Contra o Genocídio do Povo Negro, que será realizado no dia 25 de abril, às 9h, em frente à Secretaria de Segurança Pública da Bahia, no Centro Administrativo da Bahia (CAB). A manifestação busca denunciar a impunidade e exigir mudanças na política de segurança pública da Bahia.

Abaixo, relembre cinco casos em que as balas perdidas tiveram alvo, cor e endereço certo no Brasil:

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1. Ana Luíza Silva dos Santos de Jesus

Em 13 de abril de 2025, Ana Luíza Silva dos Santos de Jesus, de 19 anos, foi baleada na barriga e morreu durante uma ação da Polícia Militar no bairro da Engomadeira, em Salvador (BA). A jovem retornava da casa de uma amiga quando foi atingida. Segundo familiares, a polícia já chegou atirando, sem motivo aparente, em uma área que estava tranquila.

Segundo a PM, policiais da 23ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM) foram alvejados por suspeitos e revidaram. Durante a varredura, encontraram Luíza ferida e a levaram para atendimento médico, mas ela não resistiu.

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2. Maria de Jesus da Silva

Em 27 de março de 2025, Maria de Jesus da Silva, de 87 anos, foi atingida por bala perdida dentro de casa, no bairro Nordeste de Amaralina, em Salvador (BA), durante uma operação policial. Ela estava almoçando quando foi baleada no braço direito – foram encontradas ao menos cinco perfurações em seu corpo. Socorrida por vizinhos, Maria passou por cirurgia no Hospital Geral do Estado, mas não resistiu aos ferimentos e faleceu.

Segundo moradores, os policiais chegaram atirando, enquanto a Polícia Militar afirma que revidou após ser atacada. O caso está sob investigação do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa.

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3. Wesley Barbosa da Conceição

Em 21 de dezembro de 2023, Wesley Barbosa da Conceição, de 29 anos, foi baleado por policiais militares em São Paulo (SP), após supostamente ser confundido com um assaltante. O jovem, que trabalhava vendendo doces no semáforo da Avenida 23 de Maio, foi atingido por dois tiros no abdômen. Ele precisou esperar duas horas para ser socorrido, passou por cirurgia, mas não resistiu aos ferimentos e morreu em 28 de dezembro.

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4. Kathlen Romeu

Em 8 de junho de 2021, Kathlen Romeu, uma jovem de 24 anos grávida de quatro meses, foi morta por um tiro de fuzil no peito durante uma operação da Polícia Militar no Complexo do Lins, na Zona Norte do Rio de Janeiro (RJ). Ela tinha ido visitar a avó materna, que morava na comunidade.

Em março de 2025, a Justiça do Rio de Janeiro decidiu que os policiais militares Marcos Felipe da Silva Salviano e Rodrigo Correia de Frias, acusados pela morte de Kathlen, irão a júri popular. A data do julgamento ainda não foi definida e os policiais aguardam em liberdade.

Na época da morte, a Polícia Militar afirmou que os agentes foram atacados por criminosos no “Beco da 14”, mas testemunhas negaram o ataque. A defesa de Rodrigo alegou que ele reagiu a uma agressão e não foi responsável pelo tiro. Já a defesa de Marcos questionou as provas e testemunhas do Ministério Público e informou que irá recorrer da decisão.

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5. Ágatha Felix

No dia 20 de setembro de 2019, Ágatha Félix, de oito anos, voltava pra casa de Kombi com a mãe quando foi baleada nas costas na comunidade da Fazendinha, no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro (RJ). Apesar de testemunhas  afirmarem que não estava acontecendo nenhum tiroteio, segundo a Polícia Militar (PMERJ), os policiais “foram atacados de forma simultânea por marginais daquela localidade”.

O PM Rodrigo José de Matos Soares foi identificado como autor do tiro de fuzil e denunciado pelo Ministério Público do Estado (MPRJ) pelo crime de homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima. A Justiça  aceitou a denúncia em dezembro de 2019 e Rodrigo virou réu.

Após inquérito, os investigadores concluíram que o policial atirou ao confundir a esquadria de alumínio carregada pelo garupa de uma moto com uma arma. Em julgamento, foi absolvido das acusações por um júri popular em novembro de 2024, que entendeu que Rodrigo atirou “sem intenção de matar”.