Favela Compassiva, voluntária, idosas, cuidado, longevidade

“Cuidar é minha missão”, diz Edna Maria, voluntária no Favela Compassiva

Cuidadoras voluntárias no projeto Favela Compassiva contam as alegrias e dificuldades nos cuidados de pessoas idosas.

Por Mariana Oliveira

08|11|2023

Alterado em 08|11|2023

Edna Maria é uma cuidadora voluntária do Favela Compassiva, projeto criado em 2018 para atender pacientes em vulnerabilidade social nas favelas da Rocinha e Vidigal, na cidade do Rio de Janeiro. Moradores cedem seu tempo e disposição para acompanhar e tentar minimizar o sofrimento de pessoas com diagnóstico de uma doença grave.

Cuidado paliativo é um conjunto de práticas de assistência com o objetivo de amenizar as dores de origem física, psicológica, social ou espiritual do paciente. O Favela Compassiva visa mostrar a importância do cuidado em qualquer estágio de uma doença, com a premissa de que “todo ser humano tem direito à saúde, ao alívio da dor, à informação sobre seu real estado de saúde e o direito de não ser submetido a tratamento desumano ou degradante”.

Nascida em Feira de Santana, na Bahia, Edna Maria se mudou para a capital carioca em busca de trabalho aos 18 anos. Vivendo há seis na Rocinha, em 2019 foi convidada para integrar o grupo de cuidadores.

Sempre tive o sonho de ajudar as pessoas e acho que Deus ouviu minhas preces. Já que não posso ajudar financeiramente, dou meu tempo.

Aos 59 anos, nunca se casou e não  teve filhos. Cuidar é uma de suas maiores satisfações. “Me sinto bem em conversar, dar uma palavra amiga. Se precisar lavar a roupa, arrumar a casa, limpar uma geladeira e fazer uma comida, estou disposta, lava minha alma. Sinto que eles gostam quando chegamos com todo amor e cuidado, porque alguns não são acolhidos pelos próprios parentes”, explica.

Em 2018, enfrentou um câncer de intestino, passou por um procedimento cirúrgico e aguarda alta médica. “Tenho essa consciência de que não vou ficar mais 100%, mas o médico me deixou um pouco mais tranquila”, desabafa. Mesmo com o diagnóstico, procura conciliar os cuidados com a própria saúde e dos afilhados do Favela Compassiva.

Edna faz parte da estatística de mulheres que doam parte de seu tempo para cuidar do próximo. Desde a pandemia de Covid-19, o número de pessoas que cuidam de idosos no país saiu de 3,7 milhões, em 2016, para 5,1 milhões em 2019. Mesmo atuantes no  mercado de trabalho, mulheres se dedicam cerca de 18,5h por semana ao cuidado de outra pessoa e afazeres domésticos, enquanto os homens dispõem em média 10,4h. Foi o que atestou o relatório divulgado em 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Hilda Ferreira também é voluntária no projeto desde 2019. Natural do Maranhão, mudou-se para o Rio de Janeiro aos 12 anos, atualmente aos 47 anos, se sente realizada ao trabalhar no projeto, mesmo em meio a dificuldades. 

Minha última afilhada é amputada e tem um filho dependente químico que a agride verbal e fisicamente. Infelizmente tive de me afastar para minha segurança e dos meus filhos, continuo cuidando dela, mas à distância.

Apesar dos contratempos, Hilda se sente orgulhosa e grata pelo serviço que presta e não se imagina fora da iniciativa. “Enquanto eu estiver viva quero fazer parte”. Ela abriu o coração ao contar que um de seus quatro filhos já manifestou interesse em se voluntariar. “Ele me deixou cheia de orgulho”, diz, emocionada.

Quantos Dias. Quantas Noites

Trazendo a longevidade a partir do olhar de quem cuida, estreou no último dia 12 de outubro o documentário “Quantos Dias. Quantas Noites”, dirigido por Cacau Rhoden e produção da Maria Farinha Filmes (“Aruanas”). Além da participação das cuidadoras, o filme conta com depoimento de pesquisadores do envelhecimento e educadores, em busca de desmistificar a velhice como algo negativo. 

O longa pode ser assistido no Itaú Cinemas em São Paulo (SP) e Brasília (DF). Estadão NET de Cinemas no Rio de Janeiro (RJ). No Una Belas Artes na cidade de Belo Horizonte (MG) e no Cine Metha Glauber Rocha em Salvador (BA).