Foto mostra mulher negra de olhos fechados

Menopausa e climatério: 10 coisas que você precisa saber sobre essa fase da vida

Conversamos com Adriana Ferreira, fundadora da Associação Menopausa Feliz, sobre as principais questões relacionadas às fases de transição do período reprodutivo para o infértil na vida de mulheres e pessoas com útero

Por Amanda Stabile

06|09|2023

Alterado em 13|09|2023

Você sabia que, muito antes da menopausa, os seus ovários já param de produzir hormônios? Conhecida como climatério, essa fase marca o começo da transição entre o período reprodutivo e o período infértil de pessoas com útero, e pode se iniciar a partir dos 35 anos de idade.

Porém, como aponta Adriana Ferreira, bacharel em Direito e fundadora da Associação Menopausa Feliz, não existem políticas públicas específicas que contemplem a saúde reprodutiva e sexual de pessoas na faixa etária entre 35 e 65 anos.

“A Associação Menopausa Feliz surgiu da minha própria jornada e da escassez de informações disponíveis sobre essa fase da vida”, conta a especialista, de 56 anos, que ainda na faculdade começou a sentir e compartilhar sintomas com as colegas.

Adriana Ferreira e os membros da Associação Menopausa Feliz

Adriana Ferreira e os membros da Associação Menopausa Feliz

©Sayara Sophia

Considerando sua atuação como promotora de políticas públicas e experiência anterior como assessora parlamentar, Adriana teve um insight a partir de um questionamento: será que em alguma Comissão de Direitos da Mulher ou de Saúde se discutia questões de gênero e saúde, especificamente a menopausa?

“Surpreendentemente, após pesquisas tanto a nível estadual quanto nacional, constatamos que não havia discussões sobre esse tema em andamento, nem mesmo em nosso estado (MG)”, conta.

Esse silêncio revelou não apenas uma série de sintomas que afetavam nossa saúde, mas também o fato de que a menopausa, infelizmente, era invisível para a sociedade.

Assim, em 2017, nasceu a Associação Menopausa Feliz, em Belo Horizonte (MG) para disseminar informação e influenciar políticas públicas para pessoas na menopausa.

Para contribuir com o debate sobre esse tema, conversamos com a especialista Adriana Ferreira sobre 10 questões fundamentais para aprofundar os conhecimentos sobre menopausa e climatério. Confira!

1 -Nós, mulheres da periferia: O que é menopausa?

Adriana Ferreira: A menopausa é nada mais do que o nome dado à última menstruação da vida da mulher que, segundo a literatura, geralmente ocorre entre os 45 e os 55 anos.

Além dessa, há tipos e fases diferentes da menopausa: a precoce acontece antes dos 40 anos; a cirúrgica ocorre quando, por algum motivo, é feita uma histerectomia e retirado o útero e os ovários ou pelo uso de radioterapia e quimioterapia para tratar algum tipo de câncer (nesses procedimentos acontece um processo de retirada do hormônio estrogênio, que é o hormônio que falta quando a mulher entra na menopausa); e a tardia acontece depois dos 55 anos.

2- Nós: Qual a diferença entre menopausa e climatério?

Adriana: O climatério começa a fazer parte da vida da mulher quando, em torno dos 30 a 35 anos, os ovários param de produzir hormônios. Todas nós já nascemos com uma reserva ovariana específica, então, a partir desse ponto, começamos a perdê-la gradualmente. Por volta dos 35 anos, começamos a experimentar alguns sintomas, mas muitas vezes não lhes damos muita atenção devido às demandas do dia a dia, como trabalho, estudo e, em alguns casos, gravidez.

No entanto, quando chegamos à faixa etária dos 40 anos, de acordo com a literatura, começamos a desenvolver sintomas mais intensos, como menstruação irregular, dores de cabeça, irritabilidade, insônia, e a secura vaginal. Além disso, pode haver urgência urinária, a sensação de precisar fazer xixi constantemente, o que às vezes leva a pensar que há algum problema de saúde adicional.

Esses sintomas começam a surgir, e a mulher muitas vezes pensa que passarão com o tempo ou busca ajuda médica sem compreender completamente que está vivenciando o climatério. Portanto, é importante ressaltar que o climatério pode durar de 5 a 10 anos antes da última menstruação, que, segundo a literatura, geralmente ocorre entre os 48 e 55 anos.

A principal diferença entre a menopausa e o climatério é que, durante o climatério, ainda é possível ter menstruações irregulares, enquanto na menopausa, a menstruação cessa completamente, e a mulher não pode mais gerar filhos.

3 – Nós: Há como a própria pessoa identificar que chegou nesse período?

Adriana: Essa pergunta é muito importante. Muitas de nós não têm acesso à informação, logo consideramos os sintomas como se fossem algo normal e sequer identificamos que esses sintomas fazem parte do climatério ou da menopausa. O fator que muitas vezes as leva a procurar um médico é a perda de libido e o desinteresse pelo sexo.

No entanto, nesse meio tempo, as mulheres passam por um período delicado, e muitos médicos não têm a especialização necessária em climatério e menopausa. Quando uma mulher procura um ginecologista, que é o médico especializado na saúde da mulher e na saúde reprodutiva, muitas vezes recebe apenas uma prescrição de ansiolíticos e é informada de que está passando por um momento delicado em sua vida, o que justifica a irregularidade menstrual. Essa situação pode persistir por anos, e a mulher acredita no diagnóstico do médico, já que ele é uma autoridade em saúde naquele momento.

É importante ressaltar que nem todas as mulheres têm acesso a médicos especializados, e as consultas desses profissionais podem ser caras. No nível nacional, as consultas com especialistas podem variar de R$850 a R$1800 , o que é inacessível para muitas mulheres, especialmente as mães solo e aquelas que vivem em situação de vulnerabilidade e com baixa renda.

4 – Nós: Como funciona o teste de farmácia para identificar se você está na menopausa?

Adriana: O teste de farmácia é uma maneira acessível de verificar se você está entrando na menopausa. Alguns testes rápidos para menopausa estão disponíveis em algumas farmácias, mas são importados na maioria dos casos. Eles medem especificamente o hormônio FSH (Folículo Hormônio Estimulante), que pode indicar se seus ovários estão em falência e se você está entrando na menopausa.

Para realizar o teste, basta seguir as instruções da embalagem, que são semelhantes às de um teste de gravidez. Você colhe uma amostra de urina em um recipiente, coloca na paleta indicada e aguarda o resultado. Se a paleta colorir, indica que você tem deficiência hormonal; se não colorir, está tudo bem. Essa tecnologia oferece às mulheres a conveniência de fazer o teste em casa, a qualquer momento, sem depender de consultas médicas demoradas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Essa modernidade e liberdade podem fazer toda a diferença para as mulheres que passam por essa fase.

5 – O que define a idade em que a pessoa entra na menopausa? Há como prevenir?

Adriana: Esse período é desafiador para muitas mulheres. É fisiológico e faz parte da lei da natureza, da lei da vida, que nos presenteou com essa fase. Alguns estudos e experimentos sugerem que uma mulher que não teve filhos pode atrasar esse processo, mas isso não tem base científica, são apenas especulações. Isso ressalta ainda mais a importância da educação em saúde.

Precisamos aprender como lidar com essa fase da vida, pois é um processo fisiológico e biológico, não há como retardá-lo. Assim como não podemos atrasar a chegada da adolescência, quando começamos a menstruar e nosso corpo passa por transformações naturais.

6 – Nós: Existe tratamento para os sintomas da menopausa e do climatério?

Adriana: Existem tratamentos, sim. Quando uma mulher está na casa dos 40 anos ou mais e enfrenta a menopausa, um médico especializado em menopausa pode realizar vários exames para avaliar seus níveis hormonais. O primeiro hormônio a diminuir durante o climatério é a progesterona e depois o estrogênio, o que pode causar irritabilidade e insônia, entre outros sintomas.

O médico pode prescrever progesterona como parte do tratamento. No entanto, é importante notar que essa progesterona deve ser bioidêntica, pois antigamente usávamos progesterona sintética, que tinha efeitos colaterais prejudiciais à saúde. Hoje, a ciência avançou.

Outra questão crucial durante o climatério e a menopausa é a mudança de hábitos alimentares e atividades físicas. O estrogênio, que é responsável pela forma física da mulher, começa a diminuir, levando a mudanças no corpo, como aumento da gordura abdominal. Algumas mulheres reclamam que estão ganhando peso mesmo mantendo a mesma alimentação, enquanto outras notam a pele seca, unhas quebradiças e cabelos ressecados. Esses são sintomas visíveis, mas um médico bem informado pode ajudar com reposição hormonal ou fitoterápicos, ajustando a dosagem correta.

Lembre-se de que não deve começar um tratamento com reposição hormonal ou chás sem orientação médica. Tudo deve ser feito sob supervisão profissional.

Durante a menopausa, quando a mulher não menstrua mais, a atividade física é extremamente importante. O estrogênio é responsável pela lubrificação das articulações, e sua diminuição pode causar dores articulares e estalos.

Eu mesma sou corredora amadora e lembro de quando, antes do tratamento hormonal, acordava com dores pelo corpo. Agora, com a reposição hormonal adequada, posso correr 10 km, dia sim, dia não, e estou muito feliz.

Portanto, é fundamental fazer mudanças nos hábitos alimentares e na atividade física. Quando somos mais jovens, podemos nos permitir abusar de farinha branca, sal e açúcar, desde que não tenhamos doenças crônicas. No entanto, à medida que entramos no climatério e na menopausa, uma alimentação anti-inflamatória pode fazer toda a diferença.

É importante lembrar que a menopausa pode trazer alterações hormonais que afetam a tireoide, um problema comum. Além disso, miomas uterinos podem se desenvolver, como foi o meu caso, o que me levou a fazer uma histerectomia e remover 12 miomas. Também desenvolvi hipotireoidismo e sou dependente de medicação para a tireoide pelo resto da vida. Tudo isso pode ser prevenido e tratado com informação, permitindo que as mulheres tomem medidas para cuidar de sua saúde. Informação salva vidas.

7 – Nós: Após identificar, quais os próximos passos em relação ao serviço de saúde?

Adriana: A primeira coisa a fazer após perceber qualquer sinal que possa indicar estar na menopausa ou no climatério é procurar um médico. Em seguida, é importante pedir que ele realize exames hormonais.

Pedir exames hormonais por volta dos 35 a 40 anos pode fornecer um parâmetro importante. Por exemplo, se você mede um hormônio e ele está em 300 nessa faixa etária (supondo números), você já terá uma referência. Quando entrar na menopausa, verá uma discrepância, pois o nível desse hormônio pode chegar a zero. Portanto, é vital para que o médico possa determinar a dosagem correta para a reposição hormonal ou outros medicamentos necessários.

Além disso, assim que passar dos 35 ou 40 anos, é essencial começar a praticar atividade física. Seu corpo agradecerá muito por isso. Muitas pessoas pensam que a atividade física é apenas para manter uma boa aparência, mas na verdade vai além disso. Ao praticar atividades físicas, especialmente exercícios de força como a musculação, você fortalece sua musculatura e reduz as chances de desenvolver osteoporose. Seus músculos ficarão mais rígidos e firmes, permitindo que você mantenha sua mobilidade e independência ao envelhecer.

A mudança na alimentação é inevitável durante essa fase da vida. Quando você passa por essa transição, é importante prestar atenção à sua dieta. Evitar alimentos que contenham cafeína é aconselhável, pois podem desencadear ondas de calor. É importante entender que a mudança na dieta não significa que você deve se privar de todas as coisas que gosta, mas sim compreender como a dieta pode afetar os sintomas e ajustá-la de acordo.

8 – Nós: Hoje em dia, como o Brasil lida com a assistência à saúde da mulher no climatério e na menopausa?

Adriana: É fundamental destacar que a saúde é um direito constitucional, conforme estabelecido no artigo 196 da Constituição, que afirma que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, sem discriminação e em todos os ciclos da vida. O Sistema Único de Saúde (SUS) já incorpora princípios como equidade, igualdade e universalidade.

No entanto, as mulheres que estão no climatério e na menopausa muitas vezes não têm acesso a políticas públicas específicas ou aos medicamentos necessários pelo SUS.

Isso levanta a importância de termos um número significativo de mulheres ocupando cargos de poder, pois somente as mulheres que enfrentam a menopausa podem compreender plenamente suas necessidades.

Todas as mulheres, de uma forma ou de outra, passarão por essa fase, embora possam ter sintomas leves, moderados ou graves.

Em vários estados e municípios, já existem projetos de lei em tramitação nas assembleias legislativas e a criação de semanas ou dias de conscientização sobre a menopausa e o climatério. Em Minas Gerais, por exemplo, a Associação Menopausa Feliz trabalhou junto à comissão de mulheres para apresentar propostas que resultassem nessas movimentações. Além disso, o município de Belo Horizonte criou a Semana de Conscientização sobre Menopausa e Climatério, o que destaca a importância de sensibilizar a sociedade sobre essa fase da vida das mulheres.

A nível federal, também há projetos de lei em tramitação no Senado e na Câmara dos Deputados que buscam criar políticas públicas para mulheres no climatério e na menopausa. Um próximo passo importante é a realização de uma audiência pública no Congresso Nacional para discutir a implementação dessas políticas públicas, ressaltando que esse é um direito constitucional que não pode ser negligenciado.

No entanto, é fundamental continuar a pressionar os políticos para garantir que essas políticas públicas se tornem efetivas e que as mulheres tenham acesso aos tratamentos e medicamentos necessários.

A reposição hormonal é um tratamento importante, e sua disponibilidade pelo SUS é essencial para garantir que todas as mulheres tenham acesso aos cuidados de saúde adequados durante a menopausa.

9 – Nós: Há uma questão social relacionada a quem são as mulheres que têm acesso a tratamentos para a menopausa e o climatério no Brasil?

Adriana: Existem discrepâncias significativas relacionadas ao tratamento do climatério e da menopausa, e essas diferenças muitas vezes estão ligadas às questões socioeconômicas e educacionais.

Se todas as mulheres tivessem acesso a uma campanha nacional de conscientização sobre o climatério e a menopausa, junto com informações sobre os impactos dessa fase na saúde, isso já seria um grande passo. A falta de informação leva muitas mulheres a acreditarem que os sintomas que estão experimentando são normais, quando na verdade esses sintomas podem ser tratados e gerenciados.

A menopausa representa uma oportunidade crucial para as mulheres cuidarem de sua saúde e envelhecerem de forma saudável.

No entanto, se as mulheres não tiverem acesso à informação e aos cuidados adequados durante essa fase, podem sofrer consequências negativas a longo prazo.

É importante destacar que mulheres de classes sociais mais elevadas muitas vezes têm acesso mais rápido a tratamentos médicos de qualidade, e isso pode fazer diferença na assistência médica que recebem. Médicos particulares geralmente têm mais tempo para atender seus pacientes, enquanto médicos do sistema público de saúde muitas vezes enfrentam limitações de tempo devido à grande demanda. Isso pode prejudicar a qualidade do atendimento.

A questão socioeconômica e educacional também influencia o acesso das mulheres aos tratamentos disponíveis. Algumas mulheres, mesmo tendo informações sobre os tratamentos disponíveis, podem não conseguir bancar esses tratamentos por um longo período.

Muitas vezes, o tratamento envolve consultar vários especialistas médicos, como psiquiatras para tratar problemas como insônia, irritabilidade e depressão, mastologistas para tratar problemas nas mamas, ortopedistas para problemas nas articulações, entre outros.

É fundamental que as mulheres recebam atendimento individualizado, levando em consideração suas necessidades específicas. Isso inclui atendimento multiprofissional com médicos de diferentes especialidades, dependendo dos sintomas apresentados. Além disso, é importante que os medicamentos necessários sejam oferecidos pelo SUS e que políticas públicas sejam criadas para garantir o acesso adequado ao tratamento.

No SUS, existe apenas uma medicação de reposição hormonal disponível, é possível verificar na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename). Contudo, é uma medicação via oral ultrapassada e que não atende às mulheres que retiraram útero e ovários, por exemplo. Nossa Associação já solicitou e enviou pedidos ao Ministério da Saúde em busca de informações sobre o consumo, questionamos também se a composição da medicação que eles oferecem e a dosagem, que não corresponde às necessidades de reposição de todas as mulheres, é adequada.

10 – Nós: Como seria uma política pública ideal para tratar desse tema?

Adriana: Primeiramente, seria essencial que essas políticas públicas fossem individualizadas, levando em consideração as diferenças entre as mulheres. A saúde da mulher negra, por exemplo, pode demandar abordagens diferentes da mulher branca.

Em segundo lugar, é crucial que os médicos que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS) sejam capacitados em hormonologia e fisiologia relacionadas ao climatério e à menopausa. A Associação Menopausa Feliz apresentou, inclusive, propostas nesse sentido no Plano Plurianual (PPA) do governo, visando a inclusão de políticas públicas voltadas para essa temática. Essa qualificação médica é essencial para garantir diagnósticos precisos e tratamentos adequados.

Além disso, a oferta de medicamentos específicos para mulheres na menopausa pelo SUS é de extrema importância. Medicamentos bioidênticos e outras opções terapêuticas não hormonais devem estar disponíveis. A ciência já demonstrou a eficácia desses tratamentos, e é crucial que as mulheres tenham acesso a eles para preservar sua saúde e longevidade.

A implementação dessas políticas públicas não só melhoraria a qualidade de vida das mulheres na menopausa, mas também pode resultar em uma redução nos gastos públicos, uma vez que tratamentos preventivos e adequados podem evitar cirurgias ortopédicas e o desenvolvimento de doenças crônicas relacionadas à diminuição dos hormônios.

É fundamental conscientizar a todos sobre os desafios enfrentados pelas mulheres nessa fase da vida e a importância de políticas públicas eficazes para garantir a saúde e o bem-estar delas, independente de sua origem étnica ou condição financeira.

Investir em políticas públicas bem elaboradas para mulheres no climatério e na menopausa é essencial para promover a igualdade de gênero e a saúde das mulheres.