Bruna Griphao e o arquétipo da patricinha ‘sem frescura’
Historiadora e comunicadora Letícia Leal comenta a participação da atriz Bruna Griphao no BBB. "São tão simpáticas, mas na primeira oportunidade podem deixar escapar o abismo que existe entre vocês de uma forma muito leve".
06|04|2023
- Alterado em 17|05|2024
Por Letícia Leal
A atriz e influencer Bruna Griphao, participante do programa de televisão Big Brother Brasil 2023, tem um arquétipo bastante conhecido nas universidades públicas: aquela “amiga” rica, padrão, “humilde pra caramba”. Ela gosta de funk, conhece as letras de pagode e “troca uma ideia” firmeza com você, afinal ela conhece as suas gírias.
De primeira, você simpatiza. Acha diferente uma mulher vinda de outra realidade saber se portar como uma pessoa comum. Esse estilo “patricinha que gosta da quebrada” é adorado por pessoas pobres, sabemos disso. Eu mesma já tive várias amizades assim. Elas conquistam porque, apesar de ter todos os signos da riqueza e da branquitude, são pessoas “sem frescura”. Ela sobe lá no morro para ver o Rio todinho.
Perceberam que quando ela fala sobre pessoas pretas, ela cita urubus, bananas ou estigmas, depreciando e impondo a pessoa preta a um lugar abaixo dela? #BBB23 pic.twitter.com/KqnVbEltkO
— Africanize (@africanize_) April 4, 2023
Muitas dessas pessoas sabem esconder as diferenças inconciliáveis e estruturais que estão na nossa sociedade. Elas se misturam com a gente. Quase acreditamos que somos iguais. Quase.
Mas daí, depois da aula, você atravessa a cidade para chegar em casa e ela vai de carro para um apartamento pago pelos pais. Você trabalha nas férias e ela vai para a Europa. Você rala para ter um emprego digno e ela consegue um trampo por causa do sobrenome.
São tão simpáticas, mas na primeira oportunidade podem deixar escapar o abismo que existe entre vocês de uma forma muito leve. Lembra que eu falei sobre serem mestres em ocultar as coisas? Então. Depois ela vai te chamar de agressiva, vai te deslegitimar e pode até recomendar que você procure um psicólogo caro.
A verdade é que pessoas assim gostam de se fantasiarem de periféricas, de fazer intercâmbio cultural na sua quebrada. Mas, apesar de entender que têm privilégios, ficam confortáveis em serem servidas pela trabalhadora doméstica que é “quase” da família. Deixar de usufruir dos frutos da dominação de classe e do racismo não parece uma opção, nem mesmo diante das câmeras.
Os artigos publicados pelas colunistas são de responsabilidade exclusiva das autoras e não representam necessariamente as ideias ou opiniões do Nós, mulheres da periferia.
Letícia Leal Letícia Leal é nascida e criada no Grajaú, extremo da zona sul de São Paulo (SP). É historiadora pela Universidade de São Paulo (USP) e comunicadora. No Nós, atua como Social Media.
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Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.
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