O empreendedorismo é mais desafiador para as mulheres

Estar em espaços de liderança e gestão ocupados majoritariamente por homens é uma tarefa árdua para mulheres empreendedoras.

19|05|2022

- Alterado em 17|05|2024

Por Bianca Pedrina

Ser uma mulher que decidiu ingressar no mundo do empreendedorismo e ter o seu próprio negócio requer enfrentar muitos obstáculos, sobretudo pessoais. Precisamos romper a barreira de preconceitos que nos limitam por sermos do gênero feminino.

Ser autônoma em um país quebrado é, por vezes, a única saída para muitas de nós, seja por escolha própria ou por falta de opção no mercado de trabalho.

Em um universo dos negócios ocupado há muito tempo por homens, há uma visão estereotipada apontando credibilidade de liderança a eles. Enfrentamos o preconceito e não somos vistas como capazes. Esta disputa ideológica pode nos tirar a autoconfiança e nos fazer desistir.

Assisti recentemente a um desabafo na internet de uma chef de cozinha prestes a abrir um restaurante. Com bastante experiência no ramo, ela dominava o assunto, e mesmo assim foi questionada por homens durante uma reunião, que a silenciaram e desacreditaram de seus apontamentos sobre o seu negócio. Detalhe: esta mulher já havia participado como mentora para abertura de outros negócios similares. Em seu relato, ainda abalada com o ocorrido, refletiu que se fosse um homem em seu lugar, com certeza não seria tratada daquela forma desrespeitosa.

Este relato despertou em mim o mesmo desapontamento sentido por ela, porque encarar o desafio de peitar o mundo do empreendedorismo é ainda ser questionada se este lugar de fato te pertence. A frase de efeito “lugar de mulher é onde ela quiser” quando se trata de espaços considerados de poder está longe de existir na prática.

De acordo com levantamento feito pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) sobre empreendedorismo feminino, com base nos dados da Pnadc (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), mesmo com sinais de recuperação, após a pandemia, os números ainda não menores de mulheres empreendendo.

Segundo o levantamento, 34% de mulheres eram empreendedoras, número ainda inferior à marca histórica registrada no quatro trimestre de 2019, cujo número era de 34,8%.

O estudo revelou que, em 2019, havia 1,3 milhão de empreendedoras que empregam pessoas, o que representa 13, 6%; esse número recuou em 2021, para 1,1 milhão (11,4%).

Essa fatia de mercado fica ainda menor quando fazemos o recorte de raça e gênero. No último trimestre de 2019, as mulheres negras, que eram donas de negócio, representavam 50,3%. No ano passado, esse número caiu para 48,5%. Por outro lado, o número de mulheres brancas que empreendiam passou de 48,4% para 49,9%.

Atrelado a isso, a responsabilidade que recai sobre nós de cuidar da casa e filhos, sem a divisão com parcerias, ou a falta rede de apoio, quando falamos de mães solos, são outras questões que eu considero impedimentos para que consigamos ocupar espaços do mundo dos negócios.

Estar em espaços de liderança e gestão ocupados majoritariamente por homens é uma tarefa árdua (só nos cabe “liderança” para cuidar da casa e filhos). Isso está ainda enraizado em nossa sociedade e é preciso muito esforço para romper com essa lógica.

Seja uma confeitaria, oficina de costura, restaurante, empresa do ramo da tecnologia, comunicação, que é o meu caso no Nós, (sou gestora operacional e estou à frente da área institucional coordenando os processos internos); não importa o segmento, ainda somos preteridas nesses espaços.

Romper com essa lógica é transformar também as organizações das quais somos gestoras. Cuidado esse que deve levar em conta a sobrecarga de trabalho que imputa às mulheres mais peso. Pensar um negócio que leve em conta essas questões pode ser um caminho para que nos sintamos menos cobradas e sobrecarregadas.

Apesar de todos os bloqueios, damos nosso jeito de abrir (nem que for uma fresta) janelas de oportunidades. Quando não funcionar, metemos o pé na porta. Certeza que nos chamarão de agressivas, enquanto homens são considerados assertivos. Não importa. Se chegamos até aqui é porque somos capazes. Assim como temos ocupado tantos outros espaços, esse também será nosso.


Publicado originalmente em Expresso na Perifa

Larissa Larc é jornalista e autora dos livros "Tálamo" e "Vem Cá: Vamos Conversar Sobre a Saúde Sexual de Lésbicas e Bissexuais". Colaborou com reportagens para Yahoo, Nova Escola, Agência Mural de Jornalismo das Periferias e Ponte Jornalismo.

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