Na Boca do Povo: quais os pontos de atenção do voto impresso

Nos últimos dias, a pauta do voto impresso voltou ao centro do debate, tanto no Congresso Nacional quanto na mídia. Entenda o caso!

Por Jéssica Moreira

26|07|2021

Alterado em 18|08|2021

Está Na Boca do Povo de hoje o voto impresso!

O que você precisa saber?

Se tem um assunto que voltou à tona na última semana, este com certeza foi o voto impresso, remexendo com o jogo político brasileiro um ano antes das eleições presidenciais de 2022. Na sexta-feira (23), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou que pode investir até R$2 bilhões para comprar impressoras a serem utilizadas nas urnas eleitorais eletrônicas.

Por que impressoras? Diferente do que foi o voto impresso no passado – quando eleitores e eleitoras utilizavam cédulas de papel – caso a medida seja aprovada, os eleitores continuarão utilizando a urna eletrônica, mas a máquina irá imprimir automaticamente um registro de cada voto em um espaço de acrílico lacrado, sem intervenção direta do eleitorado.

Bolsonaro alega que esse modelo pode garantir a contagem de modo manual, em caso de suspeita de fraude. Seu posicionamento é duramente criticado por cientistas políticos, porque demonstra descredibilidade com o atual sistema político brasileiro que utiliza a urna eletrônica. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nunca houve registros de fraudes comprovados.

Em que contexto isso ocorre?

A fala integra um conjunto de outros pronunciamentos do presidente ou membros do seu governo em torno da “volta do voto impresso” – uma bandeira levantada por ele antes mesmo de chegar ao poder.

Na quinta-feira (22), o jornal O Estado de S. Paulo veiculou reportagem apontando que o Ministro da Defesa, Walter Braga Netto, ameaçou condicionar as eleições de 2022 ao voto impresso. Uma das testemunhas, que preferiu não se identificar, afirmou que o ministro Braga Netto disse: “A quem interessar, diga que, se não tiver eleição auditável, não terá eleição”.

O recado foi repassado para o presidente da Câmara, Artur Lira, por meio de um interlocutor político não desvendado na matéria. É importante lembrar que no mesmo dia, 8 de julho, Bolsonaro disse em entrevista em frente ao Palácio do Alvorada: “Eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”.

Dias depois, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, falou em coletiva contra a fala de Bolsonaro e Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), assim fez também o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No dia 22 de julho, o vice-presidente, Hamilton Mourão, pontuou que haverá eleições, independente do resultado do projeto de voto impresso.

Em 2014, quando Dilma Rousseff (PT) foi reeleita, seu adversário Aécio Neves (PSDB) alegou que o processo havia sido fraudado. Foi realizado um levantamento que comprovou que o então presidenciável estava enganado. Desde então, a questão sempre vem à tona quando uma eleição se aproxima.

Todos os pronunciamentos atuais de Bolsonaro e seu governo acontecem em meio à tramitação da PEC 135/2019 (proposta de emenda à Constituição), que, se aprovada, implantaria exatamente o modelo de voto impresso defendido por Bolsonaro.

A proposta foi redigida pela deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) e tem como relator o deputado Filipe Barros (PSL-PR). Ambos integram a base governista. As falas trazem ainda como pano de fundo as acusações de Bolsonaro de que as eleições no Brasil são fraudadas, mas sem nenhuma prova. Um exemplo é que, em 2018, o próprio Jair Bolsonaro venceu a eleição por meio do voto eletrônico e mesmo assim alegou fraude no primeiro turno.

Como isso atinge você?


As urnas eletrônicas completaram 25 anos em 2021, contabilizando um total de 13 eleições bem sucedidas e sem nenhuma comprovação de fraude. Elas começaram a ser implantadas no Brasil em 1996.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), já nas Eleições de 1996, 57 cidades utilizaram a urna eletrônica, ou seja, 70 mil urnas e mais de 32 milhões de brasileiros e brasileiras, o que representava um terço do eleitorado daquele período. Em 2000, passou a ser utilizada de forma definitiva em todo o território nacional.

O grande objetivo era eliminar possíveis fraudes que existiam no sistema impresso, afastando o máximo possível a intervenção humana no processo, além de propiciar uma apuração mais rápida e logisticamente viável.

Aliás, o desejo de implementar urnas eletrônicas data de 1932, diante do primeiro Código Eleitoral, que dizia em seu artigo 57: “uso das máquinas de votar, regulado oportunamente pelo Tribunal Superior [Eleitoral]”, pois assim o sigilo do voto poderia ser também assegurado.

O TSE, inclusive, é contra a PEC e refuta Bolsonaro sobre as vulnerabilidades do atual sistema eletrônico. Em uma nota enviada à Agência Senado, o TSE aponta que as urnas eletrônicas são o que há de mais moderno para garantir “a integridade, a confiabilidade, a transparência e a autenticidade do processo eleitoral”.

Ao enunciar falas que colocam em risco as Eleições de 2022, como fez Bolsonaro, ou ainda o recado dado pelo Ministro Walter Braga Neto, pode ocorrer um impacto principalmente no sistema político e eleitoral brasileiro, estremecendo a confiança da população em um sistema que hoje é seguro, podendo inclusive ameaçar a democracia.

Para o TSE, o voto impresso traz uma série de desafios, entre eles maior chance de fraude em comparação com o voto eletrônico; o segundo obstáculo é que, a cada dois anos, o país terá que organizar um esquema logístico que garanta o transporte dos votos de 148 milhões de eleitores do Brasil. Além disso, o TSE enxerga como um problema o risco da judicialização das eleições.

Como já falamos nesta coluna e também no Episódio 37 do Podcast Conversa de Portão sobre a CPI da Covid-19, há diversos pedidos de impeachment contra Bolsonaro e uma série de indícios que apontam seu governo como culpado do colapso da Covid-19 no Brasil, o que pode ser um empecilho para sua reeleição.

Tudo isso acontece também em momento que a popularidade de Bolsonaro está comprometida. Segundo o DataFolha, publicado também em 8 de julho, a reprovação de Bolsonaro subiu para 51%, o maior índice desde que chegou à presidência.

Na Boca do Povo é uma curadoria dos acontecimentos mais importantes no Brasil e no mundo feita pela redação do Nós, mulheres da periferia. Aqui você acessa não só o fato, mas uma interpretação de como cada assunto impacta o seu dia a dia. Muita coisa acontece diariamente, e o Nós te ajuda a focar no que realmente importa.

Na Boca do Povo de hoje utilizamos informações de O Estado de S.Paulo, Folha de S. Paulo, Politize Brasil e Nexo JornalAgência SenadoPolitize! e Portal do TSE.

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