Reflexo

O apartamento onde moro tem vista para cozinhas, lavanderias e sacadas de outros moradores. A presença de mulheres nesses espaços é constante. Sempre que as vejo estão lavando, varrendo ou estendendo roupa no varal. Às vezes, é tarde da noite e, da fresta da cortina, as avisto passando e dobrando roupas sem parar. De coque […]

Por Bianca Pedrina

29|05|2014

Alterado em 29|05|2014

O apartamento onde moro tem vista para cozinhas, lavanderias e sacadas de outros moradores. A presença de mulheres nesses espaços é constante. Sempre que as vejo estão lavando, varrendo ou estendendo roupa no varal. Às vezes, é tarde da noite e, da fresta da cortina, as avisto passando e dobrando roupas sem parar. De coque na cabeça, não param um minuto.
Reflito um pouco sobre essa impressão. Não costumo ver homens nas sacadas, nas cozinhas e lavanderias. Quando aparecem, estão fumando e curtindo a brisa; ao telefone falando trivialidades; no sofá da sala em posição de descanso, com o controle na mão ou notebook no colo.
Essas casas tem a presença de homens que não avisto em situações de trabalhos domésticos. Comento isso com meu marido que solta: “Eles devem estar consertando alguma coisa, por isso, não ajudam nas tarefas. Pare de cuidar da vida dos outros ‘muié’”. Logo se redime ao perceber minha expressão de desaprovação ao comentário infeliz e tenta contornar dizendo “é brincadeira”.
Não que eu fique cuidando da vida alheia, mas no condomínio onde moro as janelas e portas das sacadas ficam uma de frente para as outras; não tem como não reparar. Realmente essas situações me chamaram atenção.
Penso que talvez seja somente coisa da minha cabeça, coincidência.
Ponho fim aos devaneios e termino de lavar os panos de prato que estavam de molho e estendê-los no varal de teto da lavanderia. Isso depois de ter lavado a louça, limpado o fogão e passado pano no chão.
Apago a luz da cozinha. Avisto meu semblante no reflexo da janela. A imagem refletida é de uma mulher com coque na cabeça e cansada. Nesse momento paro um minuto para pensar: Somos todas iguais!