Cordão da Dona Micaela: bloco na Penha homenageia parteira histórica do bairro

"Por meio do nosso cordão carnavalesco, fazemos memória de Dona Micaela Vieira, mulher negra, parteira, benzedeira, nome de praça, que trouxe à vida gerações de bebês".

Por Lívia Lima

06|02|2018

Alterado em 06|02|2018

No último domingo, 4 de fevereiro, aconteceu o primeiro desfile do Cordão da Dona Micaela, no bairro da Penha, na zona leste de São Paulo. O cordão tem como homenageada Dona Micaela Vieira, que no fim do século XIX e início do século XX, exerceu a função de parteira na região.
A iniciativa partiu dos membros da Comunidade do Rosário dos Homens Pretos da Penha e de outros integrantes de movimentos culturais do bairro, com apoio do Centro Cultural da Penha, Prefeitura Regional Penha e patrocínio do Programa Fomento à Cultura da Periferia da Secretaria Municipal de Cultura.
“Por meio do nosso cordão carnavalesco, fazemos memória de Dona Micaela Vieira, mulher negra, parteira, benzedeira, nome de praça, que trouxe à vida gerações de bebês; símbolo de cura, vida e nascimento, valorizando sua história e preservando a sua memória. Homenagear Micaela é honrar as mulheres que parejam, curam e apoiam”, afirmou Claudia Adão, porta-bandeira do cordão.

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Cordão da Dona Micaela saiu em cortejo nas ruas da Penha.

©Instagram Centro Cultural da Penha


Há poucas informações históricas sobre Dona Micaela Vieira, mas segundo referências publicadas em 1972 no livro “Penha de ontem, Penha de hoje”, de Hedemir Linguitte (acervo do Movimento Cultural Penha), a parteira viveu entre os séculos XIX e XX, e seu filho, João “da Micaela”, foi violinista e tocava serestas e chorinho.
Na Penha, Micaela ganhou o nome da praça localizada no inicio da Avenida Amador Bueno da Veiga, uma das mais importantes da região, um dos poucos casos de pessoas negras presentes em nomes de ruas na cidade, sendo o local onde o cordão terminou seu percurso.
Após a realização de uma celebração afro-brasileira na igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, o cordão saiu em cortejo do Largo do Rosário e caminhou pelas ruas até chegar à praça que homenageia Micaela, com diversas participações e um corpo musical composto de percussão e sopros fazendo referência aos antigos cordões carnavalescos paulistas, e foliões vestindo as cores do cordão: amarelo, vermelho e branco.
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Cordão da Dona Micaela saiu do Largo do Rosário, na Penha.

©Instagram Centro Cultural da Penha


“Ver o Cordão da Micaela tomando forma no chão sagrado do Largo do Rosário, espaço de ocupação e representatividade negra, alegra meu ser num tanto que as palavras não dão conta. Tivemos o nascimento simbólico do nosso estandarte, interpretado lindamente pela atriz e doula, Edi Cardoso, fato que consagra a caminhada de resistência da Comunidade do Rosário, a restauração histórica da Parteira da Penha, Dona Micaela e, ainda, relembramos que parir é natural, é vida, não é caso de hospital”, relatou Ligéa de Mateo, integrante da Comunidade do Rosário dos Homens Pretos.
“As intervenções cirúrgicas são para salvar vidas, quando se faz realmente necessário, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que a taxa de cesarianas não ultrapasse os 15%, e hoje a cada 10 partos realizados em maternidades particulares no Brasil, 8,5 são cesáreas”, completa Ligéa, que é psicóloga e mãe de três filhos.
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O bebê é um dos símbolos do cordão da Dona Micaela, que homenageia a parteira.

©Instagram Centro Cultural da Penha