O dia em que brinquei na casa da patroa da minha mãe

Recordo-me bem do dia das crianças em que fui a uma loja com meus pais comprar a tão sonhada boneca Barbie “verdadeira”, inclusive a única que ganhei e está guardada na casa dos meus pais até hoje, as outras eram imitação. Após a boneca, como toda criança, eu queria outro brinquedo, e dessa vez era […]

Por Cíntia Gomes

17|03|2015

Alterado em 17|03|2015

Recordo-me bem do dia das crianças em que fui a uma loja com meus pais comprar a tão sonhada boneca Barbie “verdadeira”, inclusive a única que ganhei e está guardada na casa dos meus pais até hoje, as outras eram imitação.
Após a boneca, como toda criança, eu queria outro brinquedo, e dessa vez era a casinha da Barbie, mas esse meus pais não tiveram condições de me dar. Minha mãe trabalhava como diarista na casa de uma família em um bairro nobre da cidade, minha vó e minhas tias que cuidavam de mim e do meu irmão até os meus pais chegarem do trabalho.
Lembro que sempre ganhava brinquedos que a filha da “patroa” não brincava mais. Eu até gostava, mesmo não sendo novos, pois sempre tinha brinquedos que nenhuma amiga minha tinha, então eu fazia a festa.
Até que um dia, minha mãe me levou para fazer um exame e como nossa casa ficava longe e não daria mais tempo de eu ir para escola, ela me levou para o trabalho dela. Minha mãe, sabendo do quanto eu queria ter uma casa de boneca – eu não esqueço – me disse: “olha filha, enquanto a menina não chega, vou deixar você brincar com a casa da Barbie dela, mas quando estiver perto dela chegar, você vai ter que sair”. Eu toda feliz, disse: “Sério! Pode deixar vou brincar e não estrago nada”. Aquele momento foi tão mágico! Tinha a casinha, tinha o carro rosa, tinha o salão de cabeleireiro, tinha o Ken e eu tinha a minha Barbie. Que emoção; ali tinha ganhado muito mais do que uma casinha só pra mim.

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Créditos: Elizabeth AE OOAK Dolls (Flickr)


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Meus pais não me deram uma casa de boneca e essa que eu brinquei não era minha, mas tive a chance de brincar e fazer de conta de que mesmo por um momento eu tive e brinquei com a casa de boneca que sempre pedi para eles.
Quando a menina chegou, minha mãe disse “essa é a fulana de tal” e ela só disse “oi” e nem quis brincar comigo. Eu logo pensei, “já brinquei com o que queria mesmo, nem ligo se ela não quer falar comigo”. Como tinha acordado muito cedo e estava com sono, minha mãe arrumou um cantinho para eu dormir e quando acordei já estava na hora de voltar para casa.
A vontade passou e quando chegava o dia das crianças, a casinha de boneca não fazia mais parte do pedido. Minha mãe mesmo sem condições, trabalhando numa casa de família, sempre fez de tudo para dar o melhor para os filhos, e mesmo que a casinha não fosse minha, de alguma maneira com seu jeito simples e com todo amor que só uma mãe dá, nas condições dela, me proporcionou um dos momentos mais encantadores da minha infância.